quarta-feira, 14 de setembro de 2011

EXPLORAÇÃO ECONÓMICA E ADMINISTRATIVA DOS COUTOS DE ALCOBAÇA - 1997

ÍNDICE








 

  ANEXOS














1.INTRODUÇÃO

            Para este trabalho delimitámos o nosso estudo aquando o estabelecimento dos monges de Claraval, em Alcobaça, desde 1153, até ao ano de 1834, data da extinção das Ordens Religiosas em Portugal.
            Já no âmbito geográfico da nossa pesquisa, circunscreve-se num vasto domínio que compreendia inúmeras Vilas, tais como, Alcobaça, Aljubarrota, Évora, Turquel, Cós, Maiorga, Alvorninha, Cela, Alfeizerão, Pederneira, S. Martinho, Santa Catarina e Paredes, verificando-se que existiam três portos de mar.
            Procuraremos fazer algumas referências, no que diz respeito aos Arcos, ditos da Memória, que representariam, na perspectiva dos Monges do Mosteiro e do seu Abade, os limites geográficos do vasto domínio de Alcobaça.
            Daremos uma visão de conjunto da organização da economia do Couto, remetendo ao incremento dado pelos monges de Alcobaça, às terras do seu senhorio (independentemente de serem as de doação inicial ou anexadas posteriormente), tanto na exploração indirecta, através das Cartas de Povoação, como da exploração directa, através das Granjas.
           
           






2. LIMITES DOS COUTOS SUA EVOLUÇÃO 1.INTRODUÇÃO



2.1 INTRODUÇÃO
           

Apesar do que se tem escrito sobre os limites dos Coutos de Alcobaça, é ainda difícil traçar com exactidão os seus limites. É certo que, durante os tempos medievais eles foram sofrendo alterações várias, umas dentro da legalidade, partindo ou não da iniciativa dos monarcas, mas de qualquer modo, sancionadas por eles, outras possivelmente, devidas á iniciativa dos próprios monges, que mais ou menos fraudulentamente, iriam alargando os seus domínios. Principalmente por isso, mas também devido á imprecisão com que por vezes, as fontes os delineavam; tais limites apresentavam-se de certo modo nebulosos, sobretudo se pretendermos cartografálos com rigor.
        

  2.1.1 Autora Iria Gonçalves


Os problemas começam a surgir logo que se aborda a primitiva doação de D. Afonso Henriques, datada de 1153. A localização das terras doadas ao Mosteiro foi feita de uma forma imprecisa, começando o monarca por situá-las algures, entre Leiria e Óbidos, limitando-se a citar alguns nomes para traçar os seus limites. Nomenclatura vaga, a sugerir vastas extensões de terreno e mais ainda, de terreno fracamente povoado.
         O certo é que os monges, a partir de Alcobaça, puderam alargar-se por uma vasta zona que cultivaram, fixando eles próprios os seus limites. Nos princípios do século XIV, o Mosteiro de Alcobaça atingia uma zona que ia de Alvorninha à Pederneira e Cós.
Mas em 1325, D. Afonso IV determinou a obrigatoriedade de os senhores apresentarem na corte os títulos de posse dos seus domínios. Os monges alcobacenses devem ter exibido, perante os ouvodores régios, a sua doação, mas houve duas parcelas que então lhe foram contestadas: a Sul, Alvorninha com todo o seu termo, a Norte, Aljubarrota, Cós e Pederneira, também com os respectivos termos.
         É certo que a par destas terras, todas as outras vilas dos Coutos de Alcobaça, foram então postas em causa, mas de uma maneira diferente, em relação a estas, apenas se impugnava ao Mosteiro o exercício de determinados direitos reais, nomeadamente direitos de justiça.
         Sobre estes direitos manteve o Mosteiro uma longa contenda com o Rei, até ter sido dada uma sentença definitiva em 1337, que se mostrou favorável ao monarca, ficando os limites bastante aproximados dos primitivos limites dos Coutos de Alcobaça. Iniciados na foz do rio de Salir, subiam o seu curso até pouco a Sul de Salir do Mato, onde começavam a seguir outro curso de água, o da ribeira  que aí vinha desaguar; passavam próximo de Trabalhia e Vimeiro, fletiam para Sul, na direcção do Vale Serrão, que pertencia ao Mosteiro; passavam entre a Ramalhosa e Almofala, direito à Serra dos Candeeiros, cujo sopé passavam a acompanhar, ( explicação esta contestada pelo o autor Pedro Gomes Barbosa, na obra “Povoamento e estrutura agrícola na Estremadura Central - séc. XII a 1325”, que mais adiante falarei); dirigiam-se depois na direcção de Chiqueda, envolviam a Bemposta e a Maiorga, vindo daí ao Alcoa, cujo curso acompanhavam até ao mar.  
O facto é que no século XIV, aquando do litígio com o Rei, o Mosteiro senhoreava uma extensão de terras muito maior, terras de que, como é obvio não queria prescindir. Assim e embora lhe tivesse sido desfavorável o pleito com o monarca, nunca foi posta de parte a ideia de recuperar efectivamente e legalmente a posse das terras contestadas.
         Foi isso conseguido com D. Pedro, em 1358, que nesta altura confirmou ao Mosteiro a posse de todo o Couto e de todos os seus direitos. Após a confirmação de D. Pedro os limites do Couto de Alcobaça, foram fixados na continuação do rio de Salir, até próximo da Matueira, seguindo depois até à ribeirados Vidais. Era este o limite Sul dos Coutos. Para Norte, continuavam paralelamente à Serra em direcção às Ataíjas, das quais só a de baixo pertencia aos domínios abaciais. Depois, iam rumo à Cumeira, contornavam o termo de Alpedriz, dirigindo-se à Costa.
         Mas dentro em pouco os Coutos de Alcobaça, cresceriam ainda um tanto mais, atingindo a sua máxima extensão. Com a doação de D. Fernando em 1368, desmembra-se do termo de Leiria, Póvoa de Paredes e em 1374, Pataias entra também na zona delimitada dos Coutos.
         Deste modo os limites do Couto passariam a ser determinados, a Norte pelo ribeiro de Lama e a partir da sua foz, pelo de Voubam. Daí a estrema iria terminar na costa, num ponto não muito preciso, a Norte de Paredes.
            Foi esta a máxima extensão, na opinião da autora Iria Gonçalves, que alcançaram os Coutos de Alcobaça, região esta que o Mosteiro organizava e administrava na sua totalidade.

2.1.2 Autor Pedro Gomes Barbosa

Pedro Gomes Barbosa,diz , que a Carta de doação não é explícita e que quase temos que adivinhar qual o circuito dos termos do Couto.[1]
         Pensa , já que a doação de 1153 não é muito clara , nada impedia que o ribeiro que marcava esses limites fosse o que passa pelo Casal dos Carvalhos e Zambujal, isto é, mais a Sul de Salir do Mato. E isto pela simples razão de não ter lógica  a passagem da linha junto a Carvalhal Benfeito, seguindo depois a cumeada da Cabeça Alta, envolvendo Vale Serrão, quase na confluência com este segundo ribeiro e subindo depois abruptamente para Norte, pelo dito Vale Serrão. Este autor, propõe, então, que a linha seguisse pelo desfiladeiro a Oeste da Ribeira dos Ameais, até à mata de Porto Mouro e daí, sim, os limites traçados por Iria Gonçalves.
A fronteira seguiria paralela à Serra, embora seja díficil dizer se tocaria o sopé dela, ou se pelo contrário, deixaria livre a via de acesso a Rio Maior, pelo Alto da Serra.
No inicio do século XIV, já Alcobaça se tinha assenhoreado de muitos terrenos circundantes, faltando-lhes apenas, para completar o circuito do Couto, na sua maior extensão, a Póvoa de Paredes, que só lhe será dada por D. Fernando.
Alguns desses assenhoramentos foram feitos por compra e doação, outros indevidamente, através das suas fronteiras, sem que os povos lhe tenham conseguido resistir, e quantas vezes com a complacência dos reis. Mas a atitude “cúmplice” dos monarcas em outros casos, levam a que o autor Pedro Gomes  Barbosa, pense que as ocupações possam ter tido, pelo menos de forma implícita, beneplácito régio.
Como diz Manuel Vieira da Natividade, embora com reconhecido exagero, mas com parte de verdade “… a maneira como os Coutos se povoaram rapidamente é bem fácil de compreender. Os frades estabeleceram-se em Alcobaça e apoderaram-se da maior parte dos terrenos cultivados que pertenciam a povos que não lhe podiam oferecer resistência. Limitaram uma àrea enorme e compreendendo que toda ela lhe pertencia, começaram a dar leis aos habitantes que existiam e a impor condições aos colonos que vinham explorar aquele frutífero torrão.”[2]
Atingisse a Serra ou não, o certo é que os limites subiam depois até à Ataíja de Baixo e deixavam livre Aljubarrota, que não estava primitivamente, integrada no Couto, designada por “Vila”, em 1228. Ainda em 1305, o Mosteiro não controlava Aljubarrota, nem parece que tivesse ainda o senhorio da Vila.
Continuando a seguir o traçado do Couto, a linha prosseguia para Norte, em direcção à Castanheira (de Cós), que não parece estar nele integrado em 1221. A Vila de Cós ficava fora desses limites, que seguiriam a “água de Cós”, como indica a doação. Tratar-se-ia, como diz Pedro Gomes Barbosa, da actual ribeira de Cós, que vai entroncar no rio da Areia, a algumas centenas de metros a Oeste dessa Vila.
Chegando aqui, o autor discorda novamente com os limites apresentados por Iria Gonçalves. Dizendo, que o tremo não poderia seguir depois o curso do rio Alcoa, visto que para isso teria que contornar a Maiorga e dirigir-se para Sul, voltando depois para Este, a poucos quilómetros de Alcobaça. Aceitando que o rio Alcobaça não se perderia nos paúis da Fervença, o rio deveria desaguar nas águas da lagoa da Pederneira, perto das actuais termas da Piedade, a escassos quilómetros do referido local, onde actualmente passa a linha da separação entre os concelhos de Alcobaça e da Nazaré.
     Segundo o mesmo autor “o Alcobaça misturava aí as suas águas com o rio do Meio e que o rio da Areia desaguava um pouco mais a Norte.
         A fronteira do Couto seguiria para Norte, a partir da Póvoa de Cós, o curso do rio de Areia, passando pela Ribeira do Pereiro (freguesia de Alpedriz), rumo à Ferraria, deixando para Leste a Vila de Alpedriz. Daí subiria até as cercanias de Casais de D.Brás (ou mesmo até Pisões), em lugar de difícil determinação, mas relativamente próximo de Mélvoa, indo em seguida pela Mata de Pataias, atingindo a fronteira do Couto o mar entre a Pederneira e (S.Pedro de) Muel.
         A partir da análise do documento de 1153,(ver documento página X) examinado detalhadamente pelo autor Pedro Gomes Barbosa, os limites parecem ser claros na profunda reentrância que é a lagoa de Alfeizerão. Do braço de mar que entra pela baixa de Salir do Porto e onde desagua o rio de Salir, dando aí origem a marinhas e paúis junto à Mota e a Mouraria. Segue pelo vale do referido rio, até ao de Ulmos (ribeira dos Ameais). Daí vai ao Cabeço de Almofala, talvez junto a um dos dois locais conhecidos hoje pelo mesmo topónimo: Azenha da Calçada.
         A fronteira segue depois, até à “Statam Publicam”, que vinha de Porto de Mós e passava por Ataíja e dirigia-se certamente para Rio Maior, seguindo o Vale que corre no sopé da Serra dos Candeeiros, no local (ou perto), onde ainda hoje passa a Estrada Nacional Número Um.
         Na realidade, na primeira doação lê-se “Sub monte Taicha”, e a menos que queiramos atribuir esse nome à Serra dos Candeeiros, teremos que definir, como limite Oriental, as colinas de Ataíja, deixando livre não apenas um corredor de passagem entre Leiria e Rio Maior, alternativo ao caminho por Mendiga e que também daria acesso a Óbidos pelas colinas de Alvorninha, mas também “dando espaço”, ao termo de Aljubarrota.
         A linha segue depois junto a essa Vila, seguindo depois para o rio de Cós, dirigindo-se, em seguida, ao rio que vem de Alpedriz. O documento diz claramente que o limite seguia o cume dos montes e “declinat ad Coz flunium”, o que significa que fazendo-se a descrição de Sul para Norte, se está a referir à margem esquerda deste rio, correndo por esses montes, até ao rio da Areia. È o vale desse rio que vai servir de limite à herdade de Alcobaça até à confluência com o rio de Lama, que acompanha para Norte, para chegar às colunas dos Casais de D.Brás.
         Depois toma a direcção do mar. A “lacunam” de que se fala no documento , e junto à qual se tinha colocado um outro marco, não é a lagoa da Pederneira, mas sim a de Pataias , ou mais provavelmente, aquela que ainda existe a Sul de Alva de Pataias, na direcção da Cruz do Pedrão. Onde o limite do Couto tão Norte, é confirmado pela Carta de Povoação de Paredes, (ver página X), dada por D.Dinis, em 1282, quando delimita os seus termos, “Asi como partem pello Couto d alcobaça”.


2.2 Alargamento dos Coutos e seu crescimento


Na opinião de Manuel Vieira da Natividade[3], a primitiva doação de Alcobaça, aos enviados de Claraval (ver imagem página X), resumia-se  a uma zona muito limitada, como se deduz da palavra herdade e só mais tarde foi acrescentada ao estabelecerem-se os pretendidos limites de tão extensos Coutos. E tanto progrediram, e tanto se afastaram e tanto se alargaram as raias da doação, o que aliás era fácil pela falta de tombos e investigações régias ou policiais, consequência das repetidas guerras com os mouros e castelhanos, que tornou fabulosa a extensão adquirida.
Todavia, esta forma de proceder não é exclusiva de Alcobaça, foi praticada por quase todos os Mosteiros e Fidalgos, e tal exagero atingiu, que já D.Afondo IV, se viu obrigado a proceder as célebres Inquirições, em que cada Senhor de Couto ou Herdade era compelido a apresentar as Cartas que lhe davam direito a esses domínios e às regalias usufruídas.
Apreciadas as doações de Alcobaça, reconhece o Rei D.Afonso IV, que o Mosteiro trazia sonegadas à coroa muitas terras do termo de Leiria, como Aljubarrota, Castanheira, Cós, Pederneira e Póvoa; a aldeia dos Vidais, a trabalhia, a Moita, o Escoral e as Alvorninhas, o Alqueidão do Mato e as ribeiras dos Vidais, do termo de Óbidos; e do outro lado, Turquel e Salir do Mato, com os seus termos. E por sentença manda que elas entrem no senhorio e na jurisdição reais.
         A pouco ficaram reduzidos os monges de Alcobaça, como se deprende dos limites que se podem determinar em face da Carta de D.Afonso IV.
         Circunscritos à primeira doação, embora favorecidos pela liberalidade régia, em virtude do pouco conhecimento da topografia régia, avigora-se cada vez com mais anseio,  a posse de mais vastos Coutos, e tenta então o Mosteiro alargar os territórios e aproveitando o momento tão propício das discussões entre D.Afonso IV e seu filho, o Infante D.Pedro.
         D.Pedro, então, pronto a liberalidades, faz nova doação aos monges, não só da parte, que seu pai fizera entrar na posse da coroa, mas acrescentando-lhes diversas regalias e privilégios. E para que essa doação tivesse efectividade, fê-la assinar por seu filho D.Fernando, a quem mandou que por sua morte e com o seu corpo entregasse ao Mosteiro quinhentas libras. Escreve, ainda o cronista Fernão Lopes[4] “ E El Rey Dom Fernando, seu filho, por se isto melhor cumprir se cantarem as ditas Missas, deu depois ao dito Mosteiro, em doação para sempre, o lugar que se chama Paredes, em termo de Leiria, com todas as rendas e senhorios que ele havia”
         Durante o reinado de D.João I, volta a ser considerada domínio régio, tanto a parte doada por D.Pedro, como a que doara D.Fernando.
         Em alternativas de gozo e desalento, continuou o Mosteiro a desfrutar os seus vastos domínios por vezes em grandes demandas com os povos revoltados até que administradores secular e comendatários submeteram, por sua vez, os monges a uma cega obediência e começaram largamente a partilhar as riquezas da abadia.
A Restauração de Portugal, em 1640, trás aos monges de Alcobaça uma era nova de felicidades e de independência com a administração autónoma, na pessoa de um abade trienal. D.João IV, na sua incongruência medrosa e mística, confirma-lhes de vez as mais largas e velhas doações e fá-los incontestáveis senhores dos vastos e riquíssimos Coutos de Alcobaça.
No entanto, e ainda segundo a opinião do autor Manuel Vieira da Natividade, essa doação, apesar da sua clareza, não trouxe o descanso espiritual aos “gloriosos monges”.
         Apesar de tudo, o domínio dos frades progride e engrandece extraordinariamente. Com actividade febril, iniciam-se obras em todo o Mosteiro, que incessantemente progridem até que a invasão francesa trás com as suas destruições, a ruína irremediável.
         O autor, conclui, então dizendo, que poderá estabelecer-se, em primeiro lugar que houve uma doação primitiva, referida a um território, cuja área se deve aproximar da das terras que D.Afonso IV, deixou de fora da sua reivindicação. Em segundo lugar, afirma que existe uma doação mais ampla, determinada e conhecida por
“Couto Velho” e “Couto Novo”, feita por D.Pedro I. E em terceiro e último lugar, que o limite dos Coutos, só definitivamente estabelecido depois da doação de D.João IV.
         O mapa reproduzido, mostra-nos os limites dos Coutos de Alcobaça depois desta última doação e indica-nos aí também os termos dos actuais concelhos de Alcobaça e Nazaré. A superfície do território dos Coutos, cerca de 44.100 hectares, era superior à do concelho de Alcobaça (40.460 hectares). Nas doações anteriores, o limite Norte, não ía além das Paredes, mas ao Sul, chegou a abranger Salir do Mato, onde existiu uma granja cisterciense.
A reforma dos forais, feita por D. Manuel I, passou a ser para os frades documento indiscutível da posse dos Coutos. Os forais das terras de Alcobaça são cópias textuais um dos outros, excepto nalguns pequenos artigos, que se referem a pescarias.
         É certo que os novos forais, embora agravando extraordinariamente povos dos Coutos, foram de inicio bem recebidos, visto que punham ao abrigo das arbitrárias exigências do Mosteiro. Pouco a pouco, porém as interpretações fantasiosas dadas pelos monges a diversos forais, interpretações na maior parte das vezes sem recurso, trouxeram o desânimo e o desespero aos povos dos Coutos e a ponto de determinarem uma forte emigração.

2.3 ARCOS DOS LIMITES OU ARCOS DA MEMÓRIA

            Ainda, segundo o mesmo autor (Manuel Vieira da Natividade), os Arcos dos Limites ou Arcos da Memória, foram construídos como marcos monumentais dos seus pretendidos domínios. Mandaram os monges levantar os dois grandes e celebrados arcos, que deveriam constituir testemunhos infalíveis da sua autoridade e do seu poder: o Arco da Memória na Serra dos Molianos (Albardos), e o do Casal do Rei, próximo de Alvorninha.
         Sem que se possa precisar, o ano de construção, não poderá ela ultrapassar os fins do século XVI, ou princípios do século XVII, como se deduz da sua arquitectura. Embora existissem marcos provisórios nos limites dos pretendidos Coutos de Alcobaça, o que parece lógico é que foi Frei Bernardo de Brito, quem compôs a inscrição que devia ser gravada no Arco da Serra, o que ainda em princípios do século XVII, se não tinha realizado.
      
Entrando na apreciação topográfica dos Arcos, claramente se verifica, que nenhum deles está em harmonia com qualquer das doações feitas ao Mosteiro. A escolha do local para a construção dos Arcos foi feita cautelosamente, e a ela presidiu uma série de cuidados que justificam uma série de dúvidas e que dão lugar a várias considerações.
         O Arco da Serra de Albardos, assenta num dente reentrante dessa Serra e de tal forma, que por outro dente mais avançado, recorta o território até ao mar, pelos limites das terras doadas a Leiria e por outras doadas aos cavaleiros de Aviz (Alpedriz), porém, sem uma grande exactidão. A linha tirada desse monte, pela Serra lateral, põe Aljubarrota fora das terras doadas e deixa Cós, fronteira a Alpedriz, em contacto com as terras abaciais, mas não nelas compreendida. Todas as povoações que hoje formam a freguesia de S.Vicentede Aljubarrota estão fora dessa linha, a que o Casal do Rei servia de marco vivo de curiosa toponímia. Isto do Nascente para Noroeste, o que praticamente confirma a moderna criação do arco e variabilidade dos limites de sucessivas e pretendidas doações.
         O Arco da Serra foi restaurado por D. Miguel, como consta num letreiro, numa das faces do momumento e que diz: “O muito alto e poderoso Rei Senhor D.Miguel me mandou restaurar em 183…”
O Arco de Alvorninha (ver imagem X), de acanhada e pouco elegante construção, fica situado próximo do Casal do Rei, outra designação idêntica à de Aljubarrota, e aí posto como marco de reconhecimento, a dizer onde acabava o domínio do Mosteiro e começavam as terras da coroa. Este arco, como se vê na gravura, têm rápida cimalha ou friso em cuja superfície se lê em grandes caracteres: “O SANTO REI AFFONSO HENRIQUES FUNDADOR DE ALCOBAÇA”. Sobre esse friso levantam-se duas grandes pirâmides e a meio, sobre pequena peanha, a estátua do Rei
Afonso Henriques, já muito alterada e corroída, mas reconhecendo-se ainda a figura protegida por largo manto[5]. Na mão direita segura a espada e sobre o braço esquerdo, dobrado quase em ângulo recto, sustenta o escudo das armas reais portuguesas.
         A topografia do Arco de Alvorninha, nada define e podemos reputa-lo a uma data um pouco mais recente do que o Arco da Serra de Albardos.
         As largas questões entre os reis e o Mosteiro, motivadas pela ambição fradesca, que tentava alargar cada vez mais os seus domínios, questões iniciadas no tempo de D.Afonso IV e terminadas no século XVIII, deram origem às pseudo doações e aos arcos monumentais.
         Podemos, portanto concluir, que os arcos monumentais da Serra dos Albardos e de Alvorninha pertencem ao número dos falsos documentos e que nenhuma importância se lhes pode atribuir para comprovar qualquer facto histórico, que não seja a hábil diligência dos monges em assegurar a posse dos territórios que desfrutavam os limites de tais arcos; constituem, quando muito, curisidades dignas de referência.

2.4 DELIMITAÇÃO DAS PARÓQUIAS DO COUTO

A divisão e delimitação das paróquias de Alcobaça só tem lugar em 1296. É o Bispo João Martins de Soalhães quem manda proceder a essa delimitação, através do seu procurador Afonso Pais, que é encarregado de ir ao Couto fazer a delimitação[6]
         Na opinião do autor Pedro Gomes Barbosa, são cinco as paróquias que foram então delimitadas:

     Aljubarrota, que engloba a Cella Nova, o Bárrio, Turquel, Évora e Carvalhal dos Vilãos.

     S. Martinho, com a Torre de Framondo, Alfeizerão e o Bacelo.

     Pederneira, compreendendo também a Serra da Pescaria, a Granja e o Valado.

     Santa Eufémia de Cós, com a Granja das Colmeias, Lugar da Vestiaria, Adega de Estar, Tornaria, Granja de Cós, Póvoa  da Bemposta e Ferraria da Dona.

     Alvorninha, com a Granja do Vimeiro, Ferraria, Granja Nova, Carvalhal, Mota, Salir do Mato e Almofala.
        
         Este acto foi a divisão definitiva, talvez o culminar de um processo que se arrastava havia muito tempo. Seria talvez a confirmação de antigos termos, que a mobilidade dos habitantes do Couto teria posto em causa em alguns lugares, podendo uma ou outra Igreja sentir-se prejudicada. Não nos podemos esquecer que estamos em pleno período de expansão colonizadora do Couto, multiplicando-se desde 1275, as Cartas de Povoação.
         Levanta-se o problema de se saber se já existiriam Igrejas nas Vilas circundantes. A da Pederneira conhecida desde 1221, pelo menos por uma Carta em que o Abade D. Pedro Viegas[7] dá em préstamo a Gonçalo Perlado da Igreja de S. Pedro, uma herdade na Castanheira de Cós. Quanto ás restantes, segundo a opinião deste mesmo autor, o caso não é de todo claro. As primeiras menções a Santa Eufémia de Cós, à Igreja de Alvorninha e à de Aljubarrota, são as contidas no documento de D. Airas Vasques, autorizando o Mosteiro a construir Igrejas nesses locais.
         Dessas apenas conhecemos a delimitação da paróquia de Alvorninha, dada a conhecer por esse mesmo Bispo, em 1253, cinco anos depois de ter sido dada autorização para a construção da Igreja. Para as de Cós e Aljubarrota não conhecemos delimitação, o que não significa, porém, que esses lugares não pudessem ter, pelo menos , uma Capela.
Ainda , segundo a opinião do autor Pedro Gomes Barbosa, e para concluir, pode dizer-se, que o autor garante a existência da Igreja da Pederneeira na região que depois será reivindicada por Alcobaça, como fazendo parte do seu Couto, até à autorização dada por D. Airas Vasques para que o Mosteiro possa construír as Igrejas
de Aljubarrota, Alvorninha e Cós. Essa Igreja de S. Pedro da Pederneira não estava sujeita ao padroado dos Alcobacenses até à sua doação pelo mesmo D. Airas, em 1247.
As paróquias são finalmente delimitadas em 9 de Novembro de 1296, por D. João Martins de Soalhães, (Vide rodapé número 6).
O documento nada diz, mas essa data sugere que a delimitação definitiva foi fruto da queixa do Abade D. Domingos II, contra a construção, pela Sé de Lisboa, de uma Igreja na Cella Nova. Pedro Gomes Barbosa diz ainda, que por esse documento ficamos a saber que Aljubarrota já tinha paróquia delimitada, mas talvez não reconhecida pelo Bispo de Lisboa, entendendo-se o acto de D. João Martins de Soalhães, como uma confirmação de antigos limites.




3. EXPLORAÇÃO ECONÓMICA DOS DOMÍNIOS DE ALCOBAÇA


3.1 FORMAÇÃO DO PATRIMÓNIO FUNDIÁRIO

       A base fundamental do património dos monges Bernardos de Santa Maria de Alcobaça, foi como se sabe, a herdade doada por Afonso Henriques. Mas, pouco tempo depois, dessa doação, começaram a suceder-se compras e doações por toda a Estremadura, num processo de alargamento da sua base fundiária.
Não constituindo as doações, neste primeiro período, o grosso das aquisições, é de crer que esta expansão se integrava num plano claro e organizado para atingir não apenas as melhores terras, mas igualmente os centros de consumo, as cidades, onde mais facilmente pudessem vender os seus produtos, comprando aí os bens que o Mosteiro necessitava.
       Assim sendo, há questões que se nos colocam. Teria já a herdade de Alcobaça terras cultivadas, como deixa transparecer o documento de Afonso Henriques, ou pelo contrário, o local estava totalmente inculto, só valorizado pelo trabalho dos monges cistercienses.

3.1.1 Dom Maur Cocheril 

     Este autor é de opinião contrária, no que diz respeito à primeira ideia enunciada, baseando-se no que prescreviam os usos de Cister[8]. Na realidade afirma, a propósito da construção da Igreja do Mosteiro, não ser exagerado um intervalo de vinte anos, entre o estabelecimento dos monges e o inicio das obras, já que tinham de começar por cultivar a propriedade, assegurar a sua subsistência e prever o recrutamento de novos monges e conversos, pois era em função da população do Mosteiro que se determinavam as dimensões da Igreja. Sustenta ainda que no final do século XII a extensão cultivada não excedia mais de dois quilómetros, em redor da Abadia.

3.1.2 Pedro Gomes Barbosa / José Mattoso

         Contrariamente ao que pensa Dom Maur Cocheril, encontra-se o autor Pedro Gomes Barbosa, que concorda com a posição de
José Mattoso[9], quando escreve: “Depois da conquista de Lisboa,
 Afonso Henriques permitiu também a criação de grandes senhorios, ao entregar aos cistercienses de Alcobaça as terras mal cultivadas e povoadas mas que se tornaram intensamente produtivas, igualmente sob o regime senhorial.”, afirma ainda, que para além dos monges terem atraído novos povoadores, mercê de condições aliciantes, reorganizaram o capital humano e as terras cultivadas do seu território, utilizando para isso todo o conceito novo de trabalho e rentabilidade, usando essa poderosa força que eram os frades conversos.

3.1.3 Manuel Vieira da Natividade

         Este autor faz referência aos Coutos de Alcobaça, em meados do século XII, como um campo recente de luta entre cristãos e sarracenos, ermo e inculto, mas que apesar desses rudes tempos de inquietação que agitavam uma nacionalidade nascente, apesar da escassez da população e do seu atraso, os monges cistercienses devotaram-se em povoar e agricultar o seu domínio; chegando o Mosteiro, para povoar os lugares mais díficeis, ao extremo de colocar aí o Marco do Couto, a que se abrigavam os criminosos perseguidos pela justiça do Rei ou dos concelhos.
         De uma forma ou de outra, começaremos por analisar os métodos de exploração directa, através das Granjas. Veremos em seguida, as zonas das matas, fornos e lagares, a exploração e trabalho do mineiro, o gado e ainda a pesca e exploração do sal.

3.2 GRANJAS

3.2.1 INTRODUÇÃO

         Ao contrário dos clunicenses, que encaravam a gestão dos seus domínios sob o ponto de vista tradicional da Nobreza, tentando extrair o máximo de rendimento através da exploração indirecta das suas terras, os cistercienses, mercê de múltiplos factores provocaram uma modificação qualitativa no sistema de exploração dos domínios monásticos. Com a reforma de S. Bernardo, o trabalho
deixa de ser encarado como forma inferior de actividade, uma punição ou uma mortificação, era elevado na sua finalidade, tornando-se uma das formas de actividade comparada à oração, que     até aí tinha constituído a tarefa principal dos monges.
         Para realizar a valorização das suas terras, dispunham os cistercienses de vários instrumentos poderosos: uma nova mentalidade, fruto da época de expansão económica que se atravessava em toda a Europa Cristã, o seu poder organizativo, uma pesquisa no campo da agronomia e uma força de trabalho disciplinada e barata, constituída pelos frades conversos e pelos laicos, que os ajudavam nas suas tarefas agrícolas. Igualmente, a reestruturação, em novos moldes, das unidades de produção que eram as Granjas, conjugando uma certa autonomia dessas explorações agrícolas, com a centralização vigilante do Mosteiro. Podemos dizer que, em certa medida, se repetia em escala reduzida, a organização dos Mosteiros da Ordem.
         Dirigidas por Mestres Granjeiros, geralmente conversos nas Granjas mais afastadas, essas células de exploração rural, exerciam também a sua influência sobre os colonos que trabalhavam as terras vizinhas pertencentes ao Mosteiro, auxiliando-os com os seus conselhos técnicos ou favorecendo a melhor produção através da selecção de sementes ou da experimentação de novas culturas. Concebidos como uma empresa económica, as Granjas Cistercienses estão dotadas com todas as estruturas necessárias, não apenas para a recolha da produção das terras que eram cultivadas pelos seus conversos, mas igualmente com todo o sistema de transformação necessário: lagares de vinho e de azeite, moinhos e outros.
         São essas células de produção que vamos encontrar espalhadas por todo o Couto de Alcobaça, organizando a exploração de propriedades dentro e fora desses limites.


3.2.2 GRANJAS ATÉ AO SÉCULO XV

         Para melhor e mais rapidamente povoarem os Coutos e realizarem o aproveitamento agrícola do seu extenso território, de modo a acudir às necessidades crescentes da Abadia e às despesas elevadas da construção do templo e das vastas edificações conventuais, os monges, que já na última metade do século XIII haviam desbravado e agricultado a maior parte das terras que ficavam até a uma légua de distância do Mosteiro (como vêm referido na obra Manuel Vieira da Natividade, 1960), propõem-se agora arrotear e entregar à cultura os restantes terrenos.
         Estabelecem assim em diferentes pontos da região, escolhidos com superior discernimento, colónias rurais, governadas por um Mestre Granjeiro, como já referi, onde irmãos conversos leigos ou noviços, se devotam, na solidão, aos rudes trabalhos agrícolas.
         Deste modo surgem as Granjas ou Quintas Cistercienses, de primoroso cultivo, com os seus olivais, vinhas, hortas e pomares, “que se viriam a transformar com o tempo em verdadeiras escolas oficinas, de onde saem os mais hábeis operários rurais”[10]
         Mas o estabelecimento das Granjas não visava apenas o cumprimento da Regra que impõe aos monges a dura obrigação de conquistarem o sustento por suas próprias mãos, constituí a forma mais perfeita de atrair, instruir e fixar colonos.
         Nas terras que circundavam as Quintas, plantam estes, vinhas, pomares e olivais; constroem ferrarias, de onde hão-de sair as ferramentas agrárias, edificam lagares e moinhos e executam os primeiros trabalhos de drenagem, nos terrenos pantanosos[11].
         Na opinião do autor Joaquim Vieira da Natividade, nalguns casos, o Mosteiro entregava aos povoadores toda a Granja, noutros só parte dela, noutros ainda, apenas os terrenos circunvizinhos, que
por sua vez eram divididos em courelas, tendo sido deste modo, que as Granjas deram origem a povoações, as quais cedo se transformaram em Vilas florescentes; novos factores de prosperidade que aumentam a opulência dos Coutos.
         Constatando que não podemos saber a data de fundação de nenhuma das Granjas, resta verificar o seu número e localização.
         Se aceitarmos como autêntico o “Auto de demarcação das Igrejas dos Coutos “ elaborado por Frei Fortunato de S. Boaventura, datado e 8 de Agosto de 1296, citada por Joaquim Vieira da Natividade[12], verifica-se já existirem nesta época no território cisterciense, pelo menos as Granjas seguintes: Granja do Valado, Granja das Colmeias, Granja de Cós, Granja do Vimeiro e a Granja Nova (Santa Catarina).
         Do século XIII, são ainda, as Granjas da Aljubarrota, S. Martinho e Salir do Mato. Durante a primeira metade do século XIV, este número eleva-se bastante, pois é mencionado, para além daquelas, as seguintes mais: Granjas do Bárrio, Granja de Turquel, Granja da Cela, Granja da Maiorga, Granja de Chiqueda, algumas das quais, terão sido criadas no século anterior. A Quinta de Vale de Ventos e a Quinta da Granja (Turquel), são de origem muito mais moderna (século XVIII).
         Além destas Granjas, intimamente associadas à História das Vilas dos Coutos de Alcobaça, referidas nas Cartas de Povoação ou nas crónicas da Abadia, outras propriedades, dentro dos Coutos, eram cultivadas directamente pelo Mosteiro. Estão neste caso, inseridas as: vinhas, os olivais, os pomares e os soutos do termo da Fervença, a Quinta da Torre, na Maiorga, a Granja de Chiqueda (Jardim), a Quinta da Ferraria (Santa Catarina), a Quinta das Cidreiras, as Quintas da Gafa e o Cidral, juntas a Alcobaça e a vastíssima cerca do Mosteiro.
         Ao olharmos para a distribuição das Granjas (vide mapa das Granjas), no território Alcobacense, reparamos que boa parte delas se situa nos Vales dos rios Alcoa e Baça. Um segundo grupo rodeia a lagoa da pederneira e um terceiro coloca-se estrategicamente na fronteira com o termo de Óbidos. A Norte, Cós controla as férteis terras do rio da Areia e a da Castanheira, junto à via por onde podiam exportar os seus produtos para Alpedriz e Porto de Mós. Para o interior, a Granja Nova e Turquel, voltam-se para a Serra, para aproveitar os terrenos de criação de gado e de extensos olivais.
         Escolhendo criteriosamente o lugar de instalação dessas unidades de produção, são tomadas em linha de conta as condições de terrenos, as linhas de água e as vias de escoamento da produção.
         Embora, Pedro Gomes Barbosa[13], afirme desconhecer , a que tipo de agricultura se dedicavam os monges, a não ser que a Granja de Turquel explorava grandes olivais. Joaquim Vieira da Natividade, admite, que já nos séculos XIII e XIV, os cultivadores cistercienses aplicassem nas terras dos Coutos os mais adiantados conhecimentos dos agrónomos romanos en árabes, fortalecidos e aperfeiçoados com a própria experiência monacal.[14]
         E foram esses conhecimentos que lhe permitiram empreender as tarefas mais dificultosas. A forma por que se encontram distribuídas as Granjas, revela-nos, a existência de um plano de aproveitamento metódico do território da Abadia, muito embora as circunstâncias favorecessem sobretudo o cultivo disperso das courelas mais férteis. Porque sendo escassa a superfície regada e modesta também a àrea de terrenos de várzea, de granjeio mais fácil e compensador, não se hesitou em arrotear as encostas e em descer assim, até à utilização dos solos mais ingratos.
         Sabiam os monges que só as espécies arbóreas e arbustivas, tornariam possível o integral aproveitamento dessas terras, daí a insistência com que se preconiza, nas Cartas de Povoação, o plantio de olivais, vinhedos e pomareres.
         O discernimento com que foram escolhidos os lugares para a instalação das Granjas, até a acertada distribuição das culturas, especialmente das espécies fruteiras. A mancha olivícola em terrenos que pela sua natureza, só pela oliveira podem ser valorizados, abonam o saber agrícola dos cistercienses.
         Sabemos que estas Granjas, como já referi, eram governadas por Mestres  e que nelas trabalhavam irmãos conversos, noviços e leigos. A transcrição de um interessante comentário judicial ao foral de Santa Catarina, feito por Manuel Vieira da Natividade, traz alguma “luz” sobre as funções dos Mestres Grajeiros[15] “… E deve aqui advertir-se que estes Mestres de que fala a carta e foral eram os religiosos que assistiam na Quinta da Ferraria, na Granja Nova, que então eram Granjas do Mosteiro e se chamavam Mestres porque tinham por discípulos aqueles moços ou mancebos que se deviam de aceitar para religiosos e os ensinavam primeiro, doutrinavam e preparavam naqueles lugares solitários para aí provarem a sua capacidade e espírito para depois lhes lançarem o hábito de noviços”

3.2.3 GRANJAS SÉCULO XV, XVI E XVII

         Ainda na linha de pensamento de Joaquim Vieira da Natividade, afirma que a história das Granjas do século XV, XVI e XVII, é singularmente obscura.
         Os cistercienses, que durante mais de cento e cinquenta anos, haviam sido sublimes na pobreza, deixam de agricultar a terra e desfrutam, agora os bens acumulados, embora tudo leve a crer que a tradição cisterciense, do esmerado cultivo da terra se mantivesse, pelo menos, dentro das Granjas e Quintas do Mosteiro, e que estas, apesar da longa crise agrícola nacional, contribuíssem para que não soçobrasse, irremediavelmente, a valiosa obra realizada durante os primeiros tempos.
Mas só na última metade do século XVIII, quando a decadência a que chegara a agricultura dos Coutos, tornava necessários novos estímulos e poderoso impulso, se procura restaurar a tradição medieval, e às Granjas é dado, de novo lugar de relevo na vida agrícola da região.
Por iniciativa do Abade Frei Manuel de Mendonça, faz-se o enxugo dos campos de Alfeizerão, Valado e Maiorga, cobertos pelo mar ainda no século XII e que no século XIV estavam transformados em pântanos e salina, embora este processo se tenha iniciado em 1291.
Esta obra considerável, tráz novas e fertilíssimas terras para o domínio do Mosteiro. A Granja do Valado uma das melhores “escolas agrícolas” do seu tempo[16], presta eficaz auxílio no aproveitamento agrícola dos novos terrenos.
A plantação de grandes olivais, na zona serrana, já iniciada no século XVII, recebe novo impulso. Nesta época constrói o Mosteiro o Lagar-Modelo da Ataíja, hoje em dia em ruína.
Dentro de uma cerca na vizinhança da lagoa Ruiva, erguia-se a vasta edificação, com ampla alpendrada e em cujas paredes se abriam, os nichos de pombal. Oito varas gigantescas, quatro de cada lado, peso contra peso, ocupavam p primeiro compartimento. Seguia-se-lhe a casa dos moinhos com as tulhas para a azeitona, numerosas, mas de pequenas dimensões, em parte embebidas nas grossas paredes.
Junto ao lagar e voltada ao Nascente, levantava-se a residência do Monge-Lagareiro, na fachada da qual, ainda hoje se vêem as armas do Mosteiro em fachada, acolhendo no seu rés-do-chão, as pias de pedra para o armazenamento do azeite.
Data também desta época, a Quinta de Vale Ventos, com o seu extenso olivedo, de onde se colhia setenta pipas de azeite[17]; o colmeal, mandado fazer pelo Revº Frei Nuno Leitão; os pomares de laranjas e de limas e os enormes reservatórios, destinados a recolher água das chuvas, gigantesca construção, com que se pretendeu suprir a falta de fontes e de cursos de água das formações jurássicas da Serra dos Candeeiros.
         A cultura fruteira, que sempre fora notável nas terras de Alcobaça, atinge neste período, desenvolvimento considerável, graças às castas afinadas e aos métodos mais aperfeiçoados de cultivo introduzidos pelos monges nas suas granjas[18].
         A grande obra de renovação pombalina fez desaparecer os vestígios que porventura existiam dos núcleos urbanos das Granjas medievais. Edifícios mais amplos, mais sólidos e mais sumptuosos substituem os cómodos improvisados e modestos dos primeiros séculos. Muram-se algumas Granjas, levantam-se portões senhoriais, reconstroem-se lagares, celeiros, abegoarias e tanques, que passaram para o domínio particular depois de 1834 e chegaram aos nossos dias desmantelados, por vezes num estado de abandono deplorável. Nas Granjas actuais, poucos vestígios subsistem da obra cisterciense.
         Sob múltiplas formas actuaram as Granjas medievais no desenvolvimento da agricultura dos Coutos: ensaiando as culturas mais adequadas a cada zona e aperfeiçoando as que se revelaram mais prometedoras, experimentando para depois divulgarem, novas culturas e novas técnicas, adestrando operários nas artes agrícolas e proporcionando aos agricultores a demonstração viva dos processos culturais mais perfeitos, fornecendo aos colonos sementes e feramentas agrárias, ensinando-lhes a tirar partido das pequenas indústrias rurais.

3.3 AS TERRAS NÃO CULTIVADAS

Os espaços não trabalhados, fossem eles bosques, charnecas ou paúis, revestiam-se de uma grande importância para qualquer domínio na Idade Média. Percebendo claramente, desde o inicio, o valor económico desses espaços, seria natural que os monges de Alcobaça os procurassem perservar. Nesse sentido tentaram proteger esses terrenos, fosse através de cláusulas muito claras nos contratos de aforamento ou das Cartas de Povoação, ou ainda através de protecção régia[19].
Na carta de Povoação da Cella Nova, os monges, autorizam os povoadores a utilizar a madeira dos bosques que estavam dentro dos termos dessa povoação, para construírem as suas casas, fazer arados e outros instrumentos agrícolas, necessários à valorização desses terrenos. O mesmo privilégio é concedido aos povoadores da Maiorga ( Barbosa, Pedro Gomes, 1992), que podem utilizar, para a sua instalação madeira da mata da Maiorga e do souto, que está junto dos moinhos da Fervença.
Ao aforar uma herdade no lombo da Sevilhana (Carvalhal Benfeito), é especifico que os foreiros não devem fazer dano à mata, mas podem retirar lenha para utilização doméstica e rama para os bois, supõe-se que a lenha, seria a que se encontrava caída no bosque, o que não implicaria pelo menos em teoria, corte de árvores ou arbustos por parte dos colonos. Quanto á rama para os bois, servia para a cama desses animais, constituindo, misturada com os excrementos, um excelente adubo natural.(Barbosa, Pedro Gomes, 1992).
As terras incultas não se limitavam às matas e bosques, verificando-se isso mesmo na Carta de Povoação de Turquel, onde é referido um mato que começava no olival da Granja e que continuava na posse dessa unidade de exploração, o que se compreende se tivermos em conta o peso que aí tinha a criação de gado. São também várias as referências a paúis, que se localizavam fundamentalmente, junto a Alfeizerão e á lagoa da Pederneira.
                                                                                                      
3.4 O GADO

         Desde o século XI, que a pastorícia tem um papel cada vez mais importante na economia, não apenas dos camponeses, mas sobretudo, dos grandes senhores fundiários. Compreende-se facilmente que tenham sido estes últimos a desenvolver em grande escala este tipo de economia. Detinham grandes propriedades, boa parte das quais podia ser deixada inculta para o apascentamento do gado.
         Tenha-se também em consideração tudo o que se podia extrair da pastorícia, desde a carne, o leite, a pele e a lã, até ao estrume para enriquecimento dos campos, o que não era de pouca importância numa época em que os progressos no refazer da fertilidade das terras eram bem pequenos. A par da marmagem, apenas aplicável a certo tipo de terrenos, apenas o estrume animal, e o que se juntava à sombra dos bosques, podia ser aproveitado.
É certo que, muitas vezes se assiste a um conflito entre os camponeses e os rebanhos do senhor, já que, com o aumento demográfico, eram necessárias cada vez mais terras de cultivo, diminuindo-se os pastos, o que acarretava, por sua vez, um empobrecimento dessas mesmas terras, por falta de estrume.
Cedo os cistercienses entenderam o valor da criação de gado, tornando-se rapidamente excelentes pastores, enriquecidos desde o século XII, pela venda de gado, lã, queijo, couro e sapatos. A valorização dos espaços vazios, que lhes foram dados, foi feita sobretudo, à base da pastorícia.
Destaca-se o grande número de ovelhas que se deve, pensamos, não apenas à diferença de preço em relação às outras espécies, mas também ao facto de serem animais mais importantes, no aspecto “comercial”, já que tudo ou quase tudo, se podia aproveitar deles.
Apascentados nas terras em pousio, ou nas que seriam futuramente trabalhadas, estrumavam-nas naturalmente. Embora os camponeses preferissem criar porcos, pois eram mais propícios ao consumo caseiro e forneciam estrume para hortas e pequenas parcelas de terreno, enquanto que aos senhores, pertencia a maior parte das ovelhas. A razão estaria talvez, na maior possibilidade desses mesmos senhores e sobretudo quando se tratava de cistercienses, colocarem no mercado os produtos que delas extraíam.(Barbosa, Pedro Gomes, 1992.)

3.5 METALURGIA

         Preocupados em retirar o máximo rendimento das suas terras, os cistercienses sabiam que só podiam atingir esse fim se, a par de uma boa gestão dos seus recursos agrícolas, dispusessem de instrumentos arroteadores de boa qualidade. Para isso tentaram obter sempre que possível o acesso às fontes de metal (Ferro), que trabalhavam directamente ou pelo menos, controlavam o seu trabalho através dos seus representantes.

         O número de ferramentas necessárias era grande. Os centros de transformação mineira eram, sempre que possível instalados junto às minas e na proximidade de cursos de água e zonas de abastecimento de lenha.
         Com a aplicação da força da água aos foles de forja, nos inícios do século XIII, obteve-se uma temperatura mais elevada e regular e uma carburação mais activa, que melhorou a qualidade do metal obtido. Mas a força motriz dos rios e ribeiros era também utilizada para o processo de esmagamento do minério, para libertar os ferreiros do trabalho da bigorna nos chamados moinhos de ferro, substituindo, com vantagem o esforço humano, graças à descoberta dos veios excêntricos que accionavam os martelos a uma cadência que poderia variar entre 60 a 120 pancadas por minuto, com martelos que pesariam cerca de 300 quilos[20]
         No centro de Alcobaça, apenas vamos encontrar uma mina de ferro, a de Águas Belas (Valado dos Frades), uma mina a céu aberto, como ainda hoje se pode ver. O tratamento do minério, talvez fosse feito no local, aproveitando a madeira do pinhal, que lhe ficava a Norte.
         Se, só há uma mina, existem contudo várias menções ao trabalho do ferro. Além das duas ferrarias, que deram o nome às granjas, um lugar chamado A dos Ferreiros, junto a Aljubarrota, e para Sul do Couto, Escorial, Casal das Ferrarias e Moinho de Ferro, entre Turquel e Santa Catarina.
         A ferraria da Maiorga está junto ao Mosteiro, nas margens do rio S. Vicente, podendo aproveitar a madeira da mata da Maiorga. O minério aí trabalhado deveria vir de águas Belas; esta ferraria devia suprir, sobretudo as necessidades e das Granjas situadas a Norte do Alcoa.
         A que ficava junto ao Vimeiro, utilizaria a madeira da mancha florestal do Carvalhal Benfeito, apoiando sobretudo as Granjas do Sul do domínio. O minério aí trabalhado poderia vir de Rio Maior, assim como o que entrava pelo Porto de Salir.

3.6 PESCA E EXPLORAÇÃO DE SAL

         A captura de peixe, necessário à mesa, sobretudo dos monges, cujas repetidas abstinências, prescritas, pela regra, baniam a carne da sua alimentação, durante uma grande parte do ano, era feita tanto no alto mar, como nas águas calmas das duas lagoas (Pederneira e Alfeizerão).
         A Pederneira e S. Martinho, eram duas povoas essencialmente piscatórias, onde o Mosteiro se ia abastecer graças, sobretudo, aos dízimos do pescado, que cobravam dos homens que se faziam ao mar.
         Mais tarde, vão receber o peixe de um terceiro porto, o de Paredes, a Norte do Couto, mas que só passou para a posse dos Bernardos por doação de D. Fernando.
         Ligada à actividade costeira, estava igualmente a exploração do sal, embora esta possa ser explorada longe da costa, como acontecia (e acontece) em Rio Maior.
Produto essencial na conservação dos alimentos, cedo se manifestou o interesse dos monges, no correcto aproveitamento das potencialidades existentes no seu domínio.





















4. A EXPLORAÇÃO ADMINISTRATIVA DO DOMÍNIO DE ALCOBÇA

4.1 MARCO DO COUTO
De duas formas se pode entender a palavra Couto. No caso particular da história de Alcobaça e segundo a sua caracterização ou especial significação. Coutar, era demarcar simplesmente ou com especiais proibições, e assim se deve entender, no que diz respeito a Alcobaça, nos primeiros anos da sua existência.
         Couto se chamava a terras ou propriedades que, pertencendo a particulares, nobres ou eclesiásticos, se achavam vedadas às justiças reais ou onde estas não tinham inteira acção, ou ainda o território sujeito a uma jurisdição particular, concedida pelo Rei a qualquer donatário ou senhorio.
         Couto, Marco do Couto ou Lugar do Couto, se chamava também a um poste, porta ou lugar estipulado, onde qualquer criminoso ficava fora da acção da justiça.
         Todos os casos existiam em Alcobaça. O Marco do Couto colocava-se de preferência, ou nas fronteiras do país, ou no limite das terras, isto é, nos lugares, onde especialmente se pretendia aumentar a população, porque muitas vezes, para junto do criminoso, deste modo defendido da acção da justiça, vinham em breve os mais próximos elementos da família e assim se constituíam pequenos núcleos, que em geral, se conservavam.
         O Marco do Couto, defendia de tanto maior número de crimes, quanto mais necessária e urgente se tornava a povoação de um lugar  ou nos pontos onde ela se pretendia desenvolver; alcançado o seu fim, era mudado para outro local.
         Confiava-se aos senhorios e donatários a aplicação das justiças nos seus domínios, mas os direitos totais de justiça tinham, senão de desaparecer , pelo menos de se modificar profundamente. Era urgente uma legislação escrita pela qual se regessem os vassalos, colonos e servos. Como inicio de futuras liberdades, estabeleceram-se, em especiais adaptações, certas leis municipais de remota origem.

4.2 FORAIS OU CARTAS DE POVOAÇÃO

         Os forais conferidos não só por nascentes comunas, elementares municípios, mas também pelos próprios senhorios de terras e donatários, como os de Alcobaça.
         Os forais, as concessões de regalias, tomam diferentes orientações e novas colónias se se estabelecem. Era necessário vincular a posse das terras com população efectiva.
         Nos primeiros forais dados pelos monges, havia grande simplicidade, um seguro estudo prático e mútuas e favoráveis regalias. De duas formas dispunham os monges, para pôr em prática essa legislação primitiva:

     uma das formas, era dando foral às terras onde já existiam colonos e portanto, onde estava feita a selecção do local agrícola que, pela sua natureza, oferecia probabilidades de exploração, (forais efectivos).


     outra, dando foral, isto é, direitos e regalias garantidos, a todos os que quisessem povoar determinado local não eleito pelos colonos, mas sim pelos monges, local a que a estes convinha, ou para fins industriais, ou para alargamento ou variedade de culturas (forais em branco).

         Legislava-se nesses códigos primordiais de acordo com as necessidades do momento, segundo a população das terras e mais vulgarmente, segundo as necessidades agrícolas e como consequência das indústrias anexas. Aqui toma o Foral o modesto e característico nome de Carta de Povoação, destinado a promover a valorização das terras, não sujeitas a um regime de exploração directa, numa política de aproveitamento total dos recursos que a herdade lhes oferecia. Isto nos casos mais gerais.[21]
         Escolhidos os lugares onde, pelas suas características particulares, se pretendia fundar um núcleo agrícola ou industrial, como por exemplo a extracção e manufactura do ferro, limitava-se ou demarcava-se o território e estabeleciam-se as condições em que este seria facultado a determinado número de povoadores.
         Não se julgue, porém, que essas Cartas de Povoação eram dadas, como delas se pode depreender, a um número certo, já fixado, de colonos, porque tal não se verificava. A quaisquer povoadores se concediam Forais especiais, como incentivo a maior desenvolvimento, porém, as regalias de maior interesse ofereciam-se aos que viessem povoar um local escolhido pelo Mosteiro, embora nesse local não houvesse colonos.
          A qualidade dos terrenos e a urgência de os povoar, explicam a concessão de maiores ou menores, regalias, e tanto maiores, quanto menos frutífero fosse o local, ou maior a urgência na sua povoação.
         E é assim que os prazos de cultura indispensáveis para que os colonos pudessem dispor livremente das terras que tinham desbravado, variavam igualmente, com a qualidade e a natureza do solo. Estas fórmulas bem calculadas, deram os melhores resultados práticos.
         Então os colonos da Maiorga e Chiqueda, só ficavam senhores dos terrenos que desbravavam, e que eram de fácil cultura e grande fertilidade, ao fim de dez anos. O prazo baixava sucessivamente para seis anos, como em Santa Catarina, Turquel e Cós; para cinco, como na Cella Nova e para três, como em S. Martinho (Vide anexo ou imagens dos forais).
         Mas, não se tratava apenas do incentivo da posse, havia a exigência de determinado número de colonos, ainda pelo mesmo motivo, a fertilidade do terreno. Quanto mais produtivos, tanto maior exigência de população.
        S. Martinho, Alfeizerão e Valado, seriam certamente os lugares mais díficeis de povoar. Terrenos alagados então, estariam infestados pela terrível malária, o flagelo que depauperava os homens e lhes tornava a progénie degenerada e fraca. Deste facto, certamente provinha a dificuldade da sua povoação.[22]
         Patenteiam-se-nos essas dificuldades ao analisar-se, por exemplo, a Carta de Povoação de S. Martinho (Vide Carta de Povoação de S. Martinho, dada apenas a seis colonos, de quem por curiosidade, deixamos os nomes: “Domingos Gonçalves, Pedro Mouro, Pedro Maça, Domingos Fatorro, Julião Julianes e João Hisgueiro, e a todos os mais que até ao número de sessenta quisessem povoar, cultivar e habitar”.
         Com o Foral da Cella Nova (Vide Foral da Cella Nova), deram-se factos curiosos. Dividiram os sesmeiros, o terreno para certo número de colonos e com áreas certamente extensas, visto que aos moradores foi impossível cultivá-las na totalidade.E ram bons os  terrenos, porém enorme a sua extensão. Surgindo divergências entre o Mosteiro e os colonos.
         Mas veja-se ainda a hábil e justa política tributária: se o terreno era arroteado pelo colono, o imposto a pagar ao Mosteiro aumentava com o acréscimo anual da produção, como se verifica, na seguinte cláusula da Carta da Cella Nova: “Porém esses agricultores são obrigados a romper, cultivar e frutificar esses herdamentos bem fielmente; e dos que novamente romperem, e da bravia até há oito anos inculta, paguem no primeiro ano a oitava parte, no sétimo a sétima, no sexto a sexta, no quinto a quinta, no quarto a quarta, e daí por diante paguem a quarta parte”.
Foi durante muito tempo extremamente limitado o número de colonos, apesar da boa vontade do Mosteiro. Com o século XIV, chegou a ânsia de trabalho, e eram os monges, pessoalmente os trabalhadores. Dispersos pelas Granjas e Quintas dos Coutos, aí se entregavam às durezas de todo o trabalho agrícola, acompanhados dos noviços.
         No isolamento das suas quintas, trabalhavam os monges, quer no amanho das terras, quer nos labores das ferrarias. Cultivariam os melhores campos, apascentariam os rebanhos, fabricariam o vinho e o azeite, e para este fim fariam a selecção de castas mais produtivas e apropriadas; espadelariam e preparariam o linho, tecê-lo-iam talvez, visto serem muitos escassos os auxiliares estranhos.
         As Cartas De Povoação, baseiam-se todas no mesmo molde. Assuntos especiais eram tratados em cada uma, como pediam circunstâncias locais, mas sem nada alterara orientação geral que presidiu à sua criação.
         Escolhemos como tipo, por ser a mais completa, a Carta de Povoação da Maiorga, assim darmos a ideia da simplicidade dessas leis primitivas.
         As restantes Cartas de Povoação que chegaram ao nosso conhecimento, repetem, com apenas variantes, as determinações da que escolhemos para modelo, e que também é a mais extensa.

         Da Carta de Povoação de Cós:
         “10º-E se alguém comprar ali algum herdamento para casar seu filho ou filha, este povoará logo o mesmo herdamento nesse mesmo ano e daí em diante nos darão depois o nosso foro anualmente.” (Vide Carta de Povoação de Cós)
         Podemos ainda verificar na Carta de Povoação de Cós, que a indolência e o desleixo não tinham perdão nas terras de Alcobaça: “

E se algum desses moradores, vagando por sua preguiça ou malícia desampararem por algum modo negligentemente esse herdamento, dêem a nós o nosso foro assim como dão os seus vizinhos a sua parte.”
         Já então se combatia a tendência para o acréscimo descomedido da propriedade individual, sem a valorização da terra pelo trabalho, tendência que havia de transformar-se, nos séculos seguintes, num dos maiores flagelos da agricultura portuguesa. Ainda na Carta de Cós encontramos esta cláusula: “…E se algum não quiser ou não puder lavrar todo o seu casal ou parte dele, dê-o a quem o lavrar de tal maneira que o dito Mosteiro haja completo todo o seu direito, e se o fazer não quiser, dê-o o Abade ou seu Procurador a quem lavre e faça nele prole.”
         A organização de cada Couto baseada em certo número de casais, constituí outro interessante aspecto a estudar: previu-se a existência de vastos domínios, e dentro deles se delimitava a superfície julgada necessária para o núcleo inicial de povoamento, ao mesmo tempo que se fixava o número de casais necessários para assegurar a povoação com provável desenvolvimento.
         Os sesmeiros, nomeados pelo Mosteiro, dividiam então, proporcionalmente e equitativamente, os terrenos, desbravados e por desbravar, por esse número de casais. Depois disso, enormes extensões ficavam ainda esperando o desenvolvimento natural da povoação ou a vinda de colonos de outras procedências.

Dois propósitos visavam os sesmeiros:
        
     Impedir que alguns colonos se asenhoreassem de largas áreas, em prejuízo de outros, ou ainda daqueles que aí quisessem estabelecer-se.

     Dividir equitativamente os terrenos de primeira e segunda ordem, em harmonia com as posses de cada um e de modo a assegurar a futuros colonos a necessária provisão de terras de cultura.

Nos lugares onde existiam terras de campo ou nos solos de encosta menos produtivos, determinava-se a espécie de cultura, como claramente se depreende do artigo 2º do Foral da maiorga: (Vide Foral da Maiorga, página X), “e nom devedes fazer vinhos nem pomares nem almoinhas nem ferregiais em esses lugares suzoditos”.
Visava-se, evidentemente, a expansão da cultura exclusiva de cereais. Esse como que ordenamento cultural é confirmado ainda , pelo artigo 3º do mesmo Foral, e que diz: “e de todo o termo da Ferraria devedes darmos o quarto de todolos que Deus hy der salvo do vinho, do azeite e das fruitas que devedes dar o quinto” (Vide Foral da Maiorga, página X).
A forma e o lugar de cobranças dos diversos foros ou tributos são assim determinados no Foral da Cella Nova, (Vide Foral da Cella Nova, que também tem tradução):
“Artigo 2º-Com tal condição e pacto que esses povoadores e moradores e todos os seus posteriores paguem a nós e a nossos sucessores anualmente a quarta parte de todo o pão e legumes na eira, de vinho no lagar, dos vinhos já feitas e plantadas, do linho no tendal e da azeitona no olival; porem, das vinhas que ao diante se plantarem nos dêem anualmente a quinta parte do vinho no lagar e semelhante a quinta parte dos pomos e frutos das árvores que novamente plantarem.”
Baseados nos artigos dessa primitiva legislação, vejamos se é possível resumir algumas interessantes notas esclarecer rapidamente a orientação dos monges. Do inicio, se alargariam estes pelas terras que cercavam o Mosteiro, e apesar das dificuldades criadas pelo reduzido número de braços, iriam pacientemente desbravando os campos e entregando-os à cultura.
A humildade dos monges primitivos, de que muitos documentos nos dão notícia, é ainda confirmada de modo indiscutível na Carta de Povoação de Turquel, (Vide Carta de Povoação de Turquel, página X), onde, num dos artigos, figura esta curiosíssima nota: “Outrossim, não devemos fazer outra povoação nem pôr outros agricultores entre a predita nova povoação e a serra da mendiga, excepto que o mestre de Turquel e os frades que aí assistem e guardam as ovelhas e outros animais nossos, possam no sobredito terreno fazer suas casas, assim como lhes parecer conveniente.”.

         Isto bastaria para mostrar que os primitivos monges se entregavam aos mais humildes trabalhos, sob a orientação do Mestre da Granja. Durante os dois primeiros séculos da sua existência em Alcobaça, não tinham, nem podiam ter outra riqueza, além dos rebanhos e das colheitas e por vezes lutariam com dificuldades de alimentação. A fase de progresso agrícola, já esboçada em tempo de D. Dinis, concretiza-se na época seguinte.
         As prescrições quanto ao cultivo revestem-se de adorável simplicidade. Lê-se por exemplo, na Carta de Povoação de Turquel: “… e devem conservar o mesmo olivedo, e plantar o que houver de plantar com qualquer enxertia, e semear e cultivar bem e fielmente e cercar o mesmo olivedo com valado ou muro que não possa ser danificado e destruído pelos gados, e se assim o não fizerem, aquele que for achado culpado e negligente perca parte que aí tiver”.
         E ainda, no mesmo Foral: “…no tempo do recolhimento ou da ceifa, devem eles mesmo com seus homens e com suas famílias, bem e fielmente ceifar o pão …”, ou ainda, no Foral da Maiorga (Vide Foral da Maiorga, página X), “…E vós deveis aos dez anos vingar o dito herdamento, morando-o continuamente com vossas mulheres e cavando e frutificando-o e plantando vinhas e olivais e pomares e rompendo bem e fielmente cada um as courelas que lhe forem assinaladas.”
         Nesta nova fase, na série de cartas conferidas num pequeno espaço de tempo, foram os monges ampliando, pouco a pouco, direitos e deveres, porém cautelosos, pelo receio da fuga dos colonos, o que para o Mosteiro representaria considerável desastre. Concedem-se, então, todas as facilidades, desde a madeira para a construção da casa, ao material agrícola, às próprias sementes. O colono chegava, e todas as dificuldades de instalação lhe eram resolvidas pelos monges.
         Distinguia-se, entre povoadores e moradores: os primeiros, a quem se entregavam terrenos cultivados e maninhos e os segundos, que recebiam em sesmaria somente maninhos. Povoadores até se completar o número expresso na carta; moradores todos os que viessem depois, ou aqueles cujo mister lhes não permitia o amanho das terras.
Passado o tempo estipulado em cada carta, para a segura aquisição das terras cultivadas, estava o colono transformado em proprietário, preso à sua gleba, que não mais abandonaria. Propriedades ubérrimas e extensas, entregues aos primitivos povoadores, transformaram-se no laço mais resistente e mais poderoso que os ligaria ao poder monástico.
Entretanto, estranha, rápida e inesperada transformação, se opera no governo monático nos últimos anos do século XIV.
Com o rápido progredir, no campo da economia rural, com a assistência assegurada dos colonos, já senhores dos terrenos desbravados, começa o Mosteiro a reconhecer que nos primitivos forais haviam sido esquecidos capítulos de extrordinária importância, e que, além de grande perda pecuniária, envolviam questões de ordem social, que importavam ao seu senhorio.
Frei João Dornelas, no abaciato de Alcobaça, quebra de vez, toda a simplicidade primitiva, transforma o monge trabalhador, num espoliador dos colonos, praticando todos os actos autoritários e violentos.
Na profunda e gananciosa revisão dos forais concedidos, procura-se especialmente, alargar as fontes de receita, indispensáveis, ao sonhado fausto e a um louco anseio de grandeza.
         Quebrados a paz, o respeito e o mútuo afecto entre os monges e os colonos, criava-se um permanente conflito e de carácter cada vez mais violento. E não é só a questão motivada pela insuficiência e imprevidência dos forais, é o lançamento de fintas, tributos e talhas, que se sucedem, em degradante e espoliadora repetição.Estes métodos, não se atenuam com os tempos, antes se agravam.
         A reforma dos forais, levada a efeito por D. Manuel I, maior ruína trouxe aos povos dos Coutos: é que além de confirmar os primitivos forais e sentenças havidas contra os colonos, vinha com a criação de novos capítulos, aumentar enormemente os encargos, embora essa reforma satisfizesse cabalmente todas as necessidades.
         Numa sequência de discórdias, continua a vida dos Coutos, agravada, ainda, com a vinda dos Abades Comendatários, que faziam dos rendimentos da Abadia, receita própria e entregavam, em geral a procuradores e Almoxarifes, a arrecadação das rendas.
        Pouco a pouco, surge o desânimo nos colonos, como natural consequência de tantos abusos, abandonam-se as propriedades e busca-se noutras partes a segurança indispensável ao honesto trabalho.
Do que se expôs, se conclui que a população dos Coutos não usufruía condições de prosperidade, pelo contrário, a miséria, por toda a parte era enorme, excepto nas casas fidalgas dispersas pelos Coutos.
As indústrias, como consequência deste mal estar geral, limitavam-se às estritamente indispensáveis a tão escassa gente e pouco podiam ir além da tecelagem do linho e da lã, dos cortumes, da cerâmica, da tanoaria e ferraria, indústrias pobres como a população, no campo da agricultura, limitavam-se à secagem de frutas, queijaria e criação de gados, extração do azeite e fabrico do vinho.
Só em meados do século XVIII, se se alargam um pouco as actividades industriais nos Coutos, mercê do aumento rápido da população e da nova era de progresso criada pelo Marquês de Pombal.

4.3 CONCLUSÃO

         Demarcados os limites das novas terras povoadas, estabeleciam-se as rendas e as obrigações dos colonos.
O pagamento, na maior parte dos casos, era de ¼ da produção, embora em algumas dessas cartas houvesse produtos sujeitos a percentagens diferentes. Assim, na Cela, das vinhas novas pagar-se-ia, a partir do quarto ano, e para sempre, 1/5 da produção. (Vide Carta de Povoação da Cella Nova).Na Maiorga, deveriam os povoadores plantar olivais e árvores de fruto, pagando apenas 1/5, embora a renda pelo olival já plantado, que a granja lhes tinha dado, fosse de ½. (Vide Carta de Povoação da Maiorga).
         Das terras novas pagavam-se rendas crescentes, como no caso da herdade a par de S. Martinho, Cella Nova e Évora, onde a renda era de 1/8 no primeiro ano até ¼, a partir do quinto ano.(Vide forais mencionados, página X).
         Para além das rendas pagas pelos colonos, que dizem respeito a direitos dominais, o Mosteiro reservava para si um conjunto de exacções que entravam no domínio dos direitos senhoriais. Mas estes, só os vamos encontrar, como é natural, nas cartas que implicavam a fundação de uma povoação já existente ou a regulamentação de uma já existente.
         Aliás, pensamos que muitas dessas povoações já estavam formadas, com as suas autoridades comunitárias, razão pela qual não encontramos mencionados esses representantes dos colonos, que sabemos terem existido. Por exemplo, a Carta de Povoação da Maiorga, encontra-se num treslado de 1330 Maio 18, feito nessa Vila a partir de uma pública forma passada em 1304, pelo juíz de Cós, Martim Martins, a pedido do juíz da Maiorga, outro Martim Martins.
         Assim, fica reservado para o Mosteiro todo o direito de alcaidaria, mordomado, açouges, fornos, relego, moinhos e azenhas. Todos estes direitos deviam ser feitos pelos foros de Santarém, que servia de modelo para todo o Couto.
         O vinho deveria ser feito nos lagares do Mosteiro, estipulando-se o pagamento, em algumas das cartas. A azeitona também devia ser aí triturada, sendo geralmente o pagamento do azeite feito no lagar.
         Sendo o trabalho das terras do Couto, em regime de exploração indirecta, cometido aos que tinham recebido carta de povoação e seus descendentes, as propriedades conheceram, dentro desses limites, uma circulação muito limitada. Os aforamentos individuais eram reduzidos, a não ser nas franjas da herdade (Alvorninha, Cós e Aljubarrota.). Sendo essas herdades fundamentalmente vinhas, planta que requeria um tratamento especial e boas e bem adubadas terras, mas que também proporcionavam bastos rendimentos[23].























5. FORAIS - DESCRIÇÃO

5.1 VILAS DOS COUTOS DE ALCOBAÇA

         No capítulo anterior, dedicado essencialmente à explicação e representação de Cartas de Povoação ou Forais atribuídos às Vilas dos Coutos de Alcobaça, tentamos esclarecer como eram e porque eram atribuídos.
         Neste capítulo, tentaremos ser mais específicos, explorando individualmente, os Forais das ditas Vilas, começando pelo Foral de Alvorninha, (seguiremos uma ordem cronológica, apresentando todos os Forais revistos por D. Manuel I).
         A fundação das Vilas dos Coutos foi acompanhada pela doação de forais aos povoadores e moradores, que nelas desejavam habitar. Estes documentos constituem uns pequenos códigos de direito público, onde ficaram fixados as relações que deviam existir, entre o senhor da terra e aqueles que a cultivavam.
A maneira de dar estabilidade e futura expansão a estas colónias agrícolas, que os frades estabeleceram em Aljubarrota, Cós, Santa Catarina, entre outras, foi conceder-lhes garantias.
A posse dos herdamentos dados, eram perpétuos e para esta perpetuidade se verificar, tornava-se necessário que os povoadores cedessem ao Mosteiro, uma percentagem dos frutos dos terrenos cultivados que lhes eram dados ou dos que viessem a colher em terras por eles desbravadas.
Os forais dados às terras reconquistadas aos mouros ou a grandes extensões desabitadas, serviam, pelas garantias que concediam, para atrair colonos.
Segundo Saldanha Oliveira e Souza[24] a lista dos Forais, passados pela Abadia de Alcobaça e o Dom Abade que os outorgou, é a seguinte:

     Alvorninha, em 1210, por D. Frei Fernando Mendes.

     Aljubarrota, em 1164/67, por D. Abade Frei Martinho I.

     Cós, em 1241, por D. Frei Pedro Gonçalves.

     Pederneira, regiam-se pelo Foral de S. Martinho.

     S. Martinho, em 1257, por D. Frei Estevam Martins.

     Paredes, em 1282, por El-Rei D. Dinis.

     Cela Nova, em 1286, por D. Frei Martinho II.

     Évora, em 1286, por D. Frei Martinho II.

     Maiorga, em 1303, por D. Frei Pedro Nunes.

     Turquel, em 1352, por D. Frei Pedro Nunes.

     Salir do Mato, em 1319/27, por D. Frei Martinho III.

     Santa Catarina, em 1333/49, por D. Frei João Martins.

     Alfeizerão, em 1342, por D. Frei João Martins.

5.2 ALVORNINHA

         Antiga vila dos Coutos de Alcobaça, actualmente pertence a Caldas da Rainha, ficando localizada a 11 quilómetros da sede do Concelho. É assim a mais antiga povoação das Caldas da Rainha.
         Após a reconquista, esta povoação ligada ao termo de Óbidos, que se desligou para incorporar nos Coutos de Alcobaça. No reinado de D. Sancho I, em 1210, foi-lhe concedido foral, passado por D. Fernando Mendes, Abade do Mosteiro de Alcobaça[25].
         Em 1329, D. Afonso IV, reclamou Alvorninha para a Coroa, entrando em litígio com os monges de Alcobaça. O diferendo só foi resolvido em 1358, por D. Pedro I, que confirmou a jurisdição do Mosteiro sobre a vila[26].
         No reinado de D. Manuel I, em 1 de Outubro de 1514, foi reformado o seu foral.
         Os frades de Alcobaça exerceram durante vários anos, grande influência no desenvolvimento da agricultura e pecuária desta zona, fundando a primeira “escola agrícola” do país à saída de Alvorninha, no concelho de Almofala.
         Foi Alvorninha vila com dois juízes, um só para a Vila e outro para o termo e teve Companhia de Ordenanças com o seu capitão. Na antiga capela do Espírito Santo, fundou-se a Misericórdia e o Hospital, tendo por alvará de D. Pedro II, em 1605, obtido os mesmos privilégios de Lisboa. Teve também Câmara e cadeia que quando da sua extinção passou para a sede do Concelho com mobiliário e arquivo.
         O “Mapa de Portugal Antigo e Moderno”, publicado em 1745, pelo Padre Baptista de Castro, atribuiu-lhe quinhentos fogos, o que deve equivaler a uma população de mil e oitocentos a dois mil habitantes.
O século XIX trouxe consigo uma profunda reorganização administrativa do país, extinguindo parte dos concelhos do Antigo Regime. Não tendo escapado a essa reforma, operada pelo regime liberal, após a guerra de 1830/32. Em 1836 é integrada como freguesia do concelho das caldas da Rainha, sendo hoje uma das maiores, se não a maior freguesia desse concelho.

5.2.1 ALMOFALA

         Os frades de Alcobaça da reconquista, exerceram grande influência na zona e, por isso, a existência de uma “escola agrícola”, uma das primeiras do país. A sua maior granja, hoje em dia, encontra-se em ruínas, situando-se na Quinta de Almofala e era possuidora de extensos e férteis terrenos [27]. Foi povoada por casais vindos de Aljubarrota e foi uma vila com uma certa importância, dentro dos Coutos de Alcobaça.

5.2.2 MOSTEIROS

         Povoação situada no termo de Alvorninha, referida nos documentos latinos como Monasterium. A tradição indica nos, que existiu nesse lugar uma comunidade monástica pré-Cister.
         Teve hospital ou albergaria ligado aos Irmãos do Espírito Santo.


5.2.3 VIDAIS

         Freguesia do concelho das Caldas da Rainha, em 1527, pertencia ao termo de Alvorninha e em 1798 era sede de uma das duas freguesias da vila de Alvorninha. Teve Hospital, ligado aos confrades do Espírito Santo.
         Próximo dos Vidais, no lugar do Casal do Rei (Casais da Memória), existiu um arco, genericamente denominado de Alvorninha, encimado pela estátua de D. Afonso Henriques.

5.3 ALJUBARROTA

         Vila muito antiga, situada nos arredores de uma riquíssima povoação neolítica - Carvalhal de Aljubarrota - foi habitada desde tempos pré-históricos.
         Aljubarrota ficou na órbita do Mosteiro de Santa Maria, quando D. Afonso Henriques e as suas tropas, a tomaram aos Mouros.
         O D. Abade Frei Martinho I, deu-lhe foral em 1164/67, renovado por D. Manuel I, em 1514.
         Foi sede do concelho, extinto em 1855, estando hoje inserida no concelho e comarca de Alcobaça. Está dividida em duas freguesias: Nossa Senhora dos Prazeres e S. Vicente.
         A grandeza dos tempos idos conferiu-lhes o privilégio de ostentar o Brasão de Armas de Aljubarrota, que costuma ser simbolizado pela figura da Brites de Almeida, segurando a pá sobre um escudo, ou uma pá de oiro em campo vermelho, ou ainda desenhada em fundo branco.

5.4 CÓS
         Vila dos Coutos de Alcobaça, é uma povoação muito antiga, cujo nome foi atribuído aos Fenícios.
         Cós foi objecto de cobiça, pela situação estratégica que ocupava na antiga lagoa da Pederneira e pela riqueza dos seus campos.
         Na Baixa Idade Média, os monges cistercienses de Alcobaça, detentores de inovações agrícolas , iniciaram um trabalho que promoveu o desenvolvimento destes campos e o seu repovoamento, tal como sucedeu com outras vilas.
         Segundo uma investigação, elaborada pelo autor Saldanha Oliveira e Souza[28], que encontrou, numa secção histórica do jornal da “Vila de Cóz - Notas Históricas. Coutos de Alcobaça. A Vila de Cóz. Eco de S. Martinho. Ano I. Nº17. Iª Quizena de Novembro de 1927.”:
         “Cóz recebeu o seu primeiro foral, ou com mais propriedade, a primeira Carta de Povoação do Abade Dom Frei Pedro Gonçalves (Alc. III. Pág. 406). O documento deve ser de 1241. Em todo o caso a sua datação estará incluida entre 1233 e 1247, anos da eleição daquele Abade, e do que lhe sucedeu no governo da Abadia Cisterciense, D. Frei Fernando II (Alc. III. Pág. 56).”
         È certo, que recebeu foral de D. Manuel I, em 1514, e teve pelourinho, que infelizmente, já não existe.
         Junto à Igreja da Misericórdia houve uma cadeia, o que prova que além de justiça própria a exercia também de facto.
         Actualmente Cós é mais conhecida pelo famoso convento das monjas bernardas, que apesar de estar em muito mau estado de conservação, contém uma Igreja extremamente preservada.

5.5 PEDERNEIRA
         Segundo a tradição, esta vila dos Coutos de Alcobaça, foi fundada pelos povos de Paredes, quando das grandes invasões de areia, que inutilizaram o seu porto e obrigaram a procurar um lugar mais a Sul, onde pudessem exercer a sua actividade.
         A pederneira foi assim chamada por ali ter sido encontrado um marco grosso como um pinheiro, cilíndrico, de pederneira, que ainda hoje existe defronte dos antigos Paços do Concelho.
         O foral de S. Martinho, concedido em 1257, contém uma passagem que se refere à pederneira (Vide Carta de Povoação de S. Martinho, página X):
         Lê-se ali o seguinte: “Mandamos também e lhes concedemos o relego de Santarém todos os outros foros sejam como o uso e o foro da Pederneira…”, ou seja , quanto à vila da Pederneira o seu primeiro foral e privilégios, foram aqueles por que se regiam os habitantes de S. Martinho e posteriormente, D. Manuel deu-lhe foral.
         A vila da Pederneira fundada nos fins do século XV ou princípios do século XVI, situava-se a dois quilómetros a Norte do primitivo porto da Pederneira. Este, aparece registado em numerosas cartas de mareardo século XV e XVI, embora datasse talvez do século XII. [29] Alguns estudiosos do assunto confirmam que o Porto já existe em 1190, e que, em 1195, era já uma Paróquia dos Coutos de Alcobaça.
         A vila da Pederneira e o seu Porto mereceram justo renome no século XVI, pois era um dos mais activos estaleiros do reino e por isso gozou de alguns privilégios.
         Como estava próximo do pinhal de Leira e a matéria prima estava mesmo à mão, o trabalho não parava. Porém, a época mais fecunda, terá sido nos finais do século XV, princípios do século XVI, depois do descobrimento da Índia.
É neste período que se funda o Hospital, levanta-se a Igreja Matriz, se institui a confraria da Misericórdia e D. Manuel lhe dá foral Novo.Ora, com a vila sob a alçada dos Coutos de Alcobaça, desenvolveu-se a indústria do peixe, juntamente com a naval.
         No século XVII a baía era muito reentrante e o mar atingia os contrafortes da serra onde se levanta a vila da pederneira. O progressivo assoreamento, acentuado no decurso do século XVIII, pôs a descoberto as terras onde hoje se encontra a Praia da Nazaré.

5.6 S. MARTINHO
No século XIII a região de S. Martinho já era arroteada pelos “monges agrónomos” de Alcobaça, como granja do Mosteiro. Data de 1275, uma Carta de Foral de S. Martinho, outorgada por D. Frei Estevam Martins.
O terreno doado á futura povoação, é o que consta da passagem, em que o D. Abade e o Convento de Alcobaça dizem: “damos e concedemos a nossa herdade que temos no nosso couto no lugar chamado de S. Martinho.” (Vide Carta de Povoação de S. Martinho, página X).
As excepcionais condições da baía, e o paralelo desenvolvimento dos Coutos de Alcobaça, contribuíram muito para o desenvolvimento de S. Martinho. Tornou-se o porto de escoamento da larga produção dos Coutos de Alcobaça e isto só por si talvez justifique o foral que lhe foi dado pelo Abade Comendatário de Alcobaça, Cardeal D. Afonso em 1495[30], seguido pelo foral Novo de D. Manuel I, dado em Lisboa a 1 de Outubro de 1518.
Em 1527 foi elevada a sede do conselho com justiça própria. Em 1712 tinha juíz ordinário, que também era juíz dos órfãos, dois vereadores, procurador de concelho e almotacé.
Em 1854 a vila era pobre e pequena e o movimento do porto limitava-se a alguns saveiros que traziam sal para a Nazaré e pouco mais. Como consequência da sua decadência é suprido o concelho no reinado de D. Pedro V., S. Martinho que tinha sido sede de concelho durante mais de trezentos anos, passou para o concelho de Alcobaça. Em 1895, foi integrada no concelho das Caldas da Rainha, onde esteve pouco tempo, pois em Janeiro de 1898, voltou para o concelho de Alcobaça, onde ainda hoje pertence.

5.7 PAREDES
         A vila das Paredes foi edificada no alto duma escarpa , que dominava o mar e protegia os habitantes das arremetidas dos piratas, que de quando em quando, assaltavam as suas casas e roubavam os seus haveres.
         Recebeu foral em 1282, quando reinava D. Dinis e a Carta de foral foi passada em Coimbra, quatro anos depois conferiu-lhe novos privilégios numa outra carta, emitida na mesma cidade, em 20 de Setembro, em que se referenciavam trinta moradores obrigados a terem preparadas “ao menos seis caravelas para a pescaria”[31].
         No reinado de D. Fernando, por Carta Régia de 17 de Maio de 1368, a vila foi doada ao Mosteiro de Alcobaça e as suas rendas tinham como destino o sufragar a alma do pai, D. Pedro I, que jaz na Abadia de Alcobaça, entrava assim a vila nos Coutos de Alcobaça[32].
Os povoadores das Paredes encontraram no lugar escolhido favoráveis para o seu desenvolvimento: lenha emadeira para o seu consumo, construção e reparação das caravelas; água potável e peixe. Deste modo a vila esteve próspera até 1340, contando oitenta e sete vizinhos e cerca de trezentos e quarenta e oito habitantes, a maior parte pescadores e oito habitantes.
Teve este porto “grande crescimento até ao tempo del Rey Dom Manoel, em que os areais circunvisinhos abalados dos ventos que naquelle sítio cursão de todas as partes descubertas, cubrirão as casas, & arearão o porto em forma q se veio a despouvar totalmente…”[33].
         Pouco mais de um século volvido, notava-se já uma certa decadência e em 1527, tinha apenas vinte e sete fogos e aproximadamente cento e oitenta pessoas.
         A decadência e o desaparecimento desta antiquíssima vila foram devidos a problemas de assoreamento, que aliás já no reinado de D. Dinis se fazia sentir. A maioria dos habitantes da vila fugiu para a Pederneira que anos depois, foi vítima de situação semelhante.
         D. Manuel I concedeu-lhe Foral Novo em  ?

5.8 CELA NOVA

         Antiga vila dos Coutos de Alcobaça que, antes de 1286, era uma granja ou herdade do Mosteiro. O Abade D. Frei Martinho II, deu-lhe o primeiro Foral em 1286. Uma nova Carta de Povoação foi-lhe exarada em 1324. Posteriormente, na reforma que D. Manuel I levou a cabo no seu reinado, confirmou o foral definitivo em 1514, com o nome de Cela Nova.    
Parte da vila assenta em antigos terrenos da Quinta da Cela Velha. Houve sempre uma íntima ligação entre as duas Celas, pois a Nova, com terras férteis e produtivas, escoava através do porto da Cela Velha os seus produtos agrícolas.
“O termo desta vila, do Norte a Nascente parte com o de Alcobaça, o do Poente com o da Pederneira e o Sul com o de Alfeizerão”, segundo rezavam as memórias do cronista cisterciense, Frei Manuel de Figueiredo, acrescentando, ainda, “Teve dois juízes do cível, crime e sizas, três vereadores e um procurador que formavam o corpo da justiça e senado da vila” e segue: “As suas imediações tinham bastantes fontes e o termo compreende muitos casais e o lugar do Bárrio, com uma ermida de S. Gregório festejado na primeira oitava da Páscoa, a Quinta da Cela Velha em que vive Francisco Joaquim de Macedo e Andrade, possuindo a Ermida de S. Bento e nobres casas da mesma quinta…” 

5.9 CELA VELHA
         Esta pequena localidade, situada à beira da antiga lagoa da Pederneira, remonta a épocas muito anteriores à formação da nacionalidade.
         Existiram na cela Velha ou proximidades, várias quintas, resistindo actualmente, a Quinta da Cela Velha, antiga granja do Mosteiro de Alcobaça.[34]

5.10 ÉVORA DE ALCOBAÇA
         Antiquíssima vila dos Coutos de Alcobaça, pensa-se que após a “Reconquista Cristã”, foi integrada nos Coutos de do Mosteiro. Depois da Carta de Povoação dos Abades dos Coutos de Alcobaça e de um foral indocumentado de D. Sancho I, teve Foral Novo em 1514, doado por D. Manuel I.
         Antes de 1285, segundo Frei Fortunato de Boaventura (Cronista do Mosteiro de Alcobaça), não era mais do que uma herdade, ou Quinta do Mosteiro de Alcobaça[35]: “Que era a vila de Évora antes de 1285. Numa herdade ou Quinta do Mosteiro, que assim lhe chama o Abade D. Fr. Martinho em carta de povoação datada daquele ano anno debaixo das mesmas condições da precedente.”.
         Só depois de lhe ser conferido o primeiro foral , em 1286, por D. Frei Martinho II, a povoação se desenvolveu. Os Abades de Alcobaça eram os seus donatários e, como tal, nomeavam os agentes da justiça para a freguesia.
         Teve pelourinho, o que implica ter tido o privilégio de administrar autonomamente a justiça local. Desse pelourinho de Évora de Alcobaça, dá-nos notícia José Diogo Ribeiro nas “Memórias de Turquel”: “…tinha também o seu pelourinho, aí o vi algumas vezes, uma noite porém, despedaçaram-no. dele apenas resta a base ou encaixe do respectivo fuste, espécie de pia que, num quintal daquela povoação tem servido de bebedouro a galináceos”[36]. Foi demolido em 1875.
         Também possuía cadeia e ainda existem vestígios da sua localização.

5.11 MAIORGA
         Localizada na zona mais povoada dos Coutos de Alcobaça, a Maiorga, tal como outras vilas, estava subjugada ao poder senhorial do Mosteiro e tinha a obrigação, de tal como Aljubarrota, Cela, Alvorninha, Évora, Cós e Santa Catarina, contribuir para a anduva do Castelo de Alcobaça.
É dos princípios do século XIV, a Carta de Povoação da vila da Maiorga. Dada pelo Abade D. Frei Pedro Nunes, em 1303, primeiro foral em 1362 e Foral Novo de D. Manuel, em 23 de Agosto de 1514[37].
A primeira Carta de Povoação incluía na Maiorga muitos casais, talvez devido à escassa população. Como eram poucos os habitantes e não chegavam para se poder constituir uma vila, foi necessário recorrer aos casais, para que tal se concretizasse.
A carta de Povoação pretendia que na Maiorga se estabelecessem cem moradores, (Vide Carta de Povoação da Maiorga, pág. X) , diz: “E os Sesmeiros deverão assinar o termo sobredito em tal maneira que haja cem casas, com cem moradores.”
A Maiorga foi coutada célebre e o maior celeiro dos frades, mas, não se pense que as suas relações com o Mosteiro fossem pacíficas. Era frequente a recusa dos habitantes em pagar os direitos dos cereais, de vinho e legumes, a dízima e mesmo alguns foros. Por isso, entram várias vezes em conflito com o podes senhorial do Mosteiro[38]
A granja da Maiorga foi uma “escola agrícola” de primoroso granjeio no período que mediou o século XIII e o XV. Porém, a partir desta data e até ao século XVII, dá-se a decadência, devidos às más relações com os Abades Comendatários e com os próprios frades, do Mosteiro de Alcobaça.
Só nos finais do século XVIII, por iniciativa do Abade Frei Manuel de Mendonça, se fez o enxugo e drenagem dos campos da Maiorga, que se tornaram extremamente férteis e trouxeram riqueza às populações.
Esta extraordinária política fez esquecer os extensos pântanos, cobertos de junco, postos a descoberto quando do recuo das águas da lagoa da Pederneira. Trabalhando com afinco, enriquecendo a vila através duma agricultura fertilíssima.
                                                                                    
5.12 TURQUEL
Turquel foi uma das vilas dos Coutos de Alcobaça, foi cabeça de concelho, teve a sua primeira Carta de Povoação em 1314, dada por Frei Pedro Nunes e foral duzentos anos depois, concedido por D. Manuel I, o chamado Foral Novo, em 1514.  A vila chamava-se então Villa Nova de Turquel
         Uma interessante publicação local sobre Turquel[39], citando a Carta de Povoação desta vila, aponta como dador da Carta, D. Frei Pedro Nunes, Abade que outorgou a Carta de Povoação á vila de Turquel, no dia um de Agosto de 1352 (César 1314).
         Diz, José Diogo Ribeiro que a Carta de Povoação de Turquel não é um Foral, por lhe faltar a característica essencial, que é a eleição de um ou de mais magistrados pelo povo.
         No entanto, se efectuarmos uma leitura, a essa mesma carta, parece-nos semelhante às outras Cartas de Povoação, das terras que temos vindo a indicar.
         O antigo concelho de Turquel compreendia a freguesia do mesmo nome e a parte oriental da freguesia da Benedita. A Câmara tinha dois juízes ordinários e dois vereadores. Além destes funcionários, havia o procurador do concelho, o almotacé, o alcaide da vara, o alcaide carcereiro, o escrivão da Câmara, tabeliães de notas e do judicial.
Para manter a ordem pública havia a “Companhia da ordenança da villa de Turquel e o seu termo”.
A vila de Turquel com o seu termo pertencia antigamente à paroquial de Santa Maria de Aljubarrota, diocese de Lisboa. Mas, por ficar muito longe da paróquia, o povo solicitou em 1528, provisão do comendatário do Mosteiro de Alcobaça (Cardeal D. Afonso), para ter na vila uma capela feita a suas próprias expensas, o que obteve deferimento. Assim, em 1528, se erigiu uma capela dedicada à nossa Senhora da Conceição, logo convertida em paróquia. Passados alguns anos, o Cardeal Infante D. Henrique, desmembrou-a de Aljubarrota.
O concelho de Turquel, foi extinto, pouco depois da abolição das ordens religiosas
.

5.13 SALIR DE MATOS
         Foi vila e cabeça de concelho dos coutos de Alcobaça, tendo então juíz ordinário, dois vereadores, procurador do concelho, escrivão da câmara, almotacil e meirinho. Fica situada a pouca distância das ribeiras da tornada e Alfeizerão, entre Caldas da Rainha e Turquel.
         D. Manuel I, deu-lhe Foral Novo, em Lisboa no dia um de Outubro de 1514 (Livro dos Forais Novos da Estremadura). Neste Foral é-lhe dado o nome de Salir do Mato.Este topónio significa que as terras em redor do lugar não estavam ainda desbravadas. Eram terras de matos, o que quer dizer que o braço desbravador dos monges de Alcobaça, ainda não haviam chegado a este local.
         Foi o D. Abade D. Frei Martinho III, que lhe deu o primeiro Foral, entre 1319 e 1327, mais tarde confirmado por D. Manuel I.
        Segundo o Cadastro de 1527, o concelho tinha de termo uma légua em largo e redondo, partia com as vilas de Alvorninha, Santa Catarina e Alfeizerão. E em 1565, o Papa Pio XIV, elevou-a a freguesia.
Teve também câmara, prisão e forca . Actualmente pertence ao Concelho das Caldas da Rainha, ao qual se ligou no ano de 1836,juntamente com mais duas antigas vilas dos Coutos de Alcobaça, Alvorninha e Santa Catarina.

5.14 SANTA CATARINA
         Foi uma das vilas dos coutos de Alcobaça, cujo donatário era D. Abade dos Bernardos do Mosteiro de Alcobaça.
         Sede do concelho teve forca e pelourinho, que ainda hoje se encontra no principal largo da vila, que constitui um sinal que teve justiça própria.
         Recebeu carta de foro em 1307, onde ficam definidos, de uma forma precisa, os limites do Couto de Santa Catarina e suas fronteiras e ainda o tipo de relação que deveria estabelecer-se entre os colonos e o Mosteiro.
         Quanto ao primeiro diploma (Foral), que regeu a vila, só se sabe que foi promulgado por D. Frei João Martins, Abade de Alcobaça. Podemos localizar a sua doação, entre os anos de 1333 e 1349, durante os quais D. Frei João Martins regeu os destinos da Real Abadia[40].
         Estas terras já estavam na posse dos monges cistercienses há muito tempo, mas como a população aqui era menos densa, do que noutros Coutos, a atribuição do Foral, só se efectuou em época posterior.
         Ao longo dos séculos XIV e XV, Santa Catarina progrediu de tal maneira, pelo menos no que diz respeito ao sector agrícola e comercial, que uma das estradas de ligação dos Coutos a Santarém passava por lá. Já era vila, quando o seu mérito foi reconhecido por D. Manuel I, que 1518, lhe conferiu um segundo Foral, o Foral Novo, refletindo esse mesmo desenvolvimento.
          O cadastro de 1527, dá trinta e um moradores na vila e sessenta e nove no termo. Até 1834, teve duas Companhias de Ordenança, cada uma com os seus capitães e oficiais.
         A jurisdição das autoridades municipais abrangia antes de 1836 a freguesia de Carvalhal Benfeito, mas com a extinção do concelho de Santa Catarina, a povoação de Carvalhal Benfeito ligou-se a Caldas da Rainha.

5.15 ALFEIZERÃO
         D. Afonso Henriques tomou-a aos mouros em 1147 e o Abade de Alcobaça ficou com o privilégio de nomear uma pessoa de alta nobreza e distinção para Alcaide-Mor.
         Atribui-se à vila de Alfeizerão a posse de dois forais, um datado de 1340 e outro de 1442. Sendo assim, temos o primeiro doado por D. Frei João Martins e o segundo por D. Frei Fernando do Quental.
         No século XVI abrangia a aldeia de Famalicão, os Casais do Raposo e a Quinta da Macarca. Dois séculos depois, já abrangia os lugares do Valado, Mosqueiros, Casalinho, Casal Velho, Val Maceira, Quinta da Mota, Casal do Rebelo e parte de Famalicão[41].
Recebeu Foral Novo de D. Manuel I. Em 1 de Outubro de
1514.
Até meados do século XVI, foi um bom porto de mar, mas com o recuo das águas e com as terras transformadas em pauis e salinas, o porto, no reinado de D. Manuel I, estava já muito assoreado.
A lagoa de Alfeizerão lentamente se ia transformando num extenso pântano, tendo sido, D. Abade Frei Manuel de Mendonça, que anos mais tarde, mandaria fazer o enxugo desse grandes pauis, para os transformar em campos de cultura, transformando-se Alfeizerão, progressivamente, numa povoação rural.
Em 1842 era freguesia do concelho de S. Martinho do Porto, mas por extinção deste, passou para o de Alcobaça e depois para o de Caldas da Rainha, onde se manteve até que por decreto de 13 de Janeiro de 1898, voltou de novo a Alcobaça.








CONCLUSÃO


            A carta de fundação de Alcobaça é datada de 8 de Abril de 1153. A doação ao Abade de Claraval, S. Bernardo, feita Pelo Rei D. Afonso Henriques, deveu-se ao prestígio e influência deste.
            De acordo com a regra de Cister, os fundadores deviam ser treze, doze monges e um abade e talvez os acompanhassem alguns conversos.
            As primeiras instalações dos monges em terras de Alcobaça, situavam-se não no actual Mosteiro, mas num Mosteiro provisório de nome Santa Maria a Velha, actual Igreja da Nossa Senhora da Conceição e foi nesse local que ficaram até 1223.
            O couto que significava segurança, era um privilégio dado a um território que ficava fora da jurisdição Régia. Poderia ser desde uma casa a um simples terreno acidentado, que o fugitivo deveria alcançar para se escapar á justiça Régia e só em 1672, este privilégio, foi definitivamente retirado ao Mosteiro.
            Este sistema original, concedeu aos domínios de Alcobaça, a designação popular, Coutos de Alcobaça.
            A preocupação principal dos Cistercienses era povoar este grande território, demasiado vasto, apenas para os monges. Desta forma concederam Forais ou Cartas de Povoação a algumas vilas de Dom Abade, que coexistiam com as Granjas.
            Ao longo de todo o período, que se estende até aos finais do século XIII e princípios do século XIV, os monges desenvolveram uma prodigiosa actividade. Observando escrupulosamente a sua regra, cultivaram eles próprios o campo, guardaram rebanhos, extraíram o ferro, forjaram as alfaias, desbravaram charnecas, enxugaram pântanos, plantaram pomares, olivais, vinhedos, onde os mestres da Granja forneciam aos caseiros da vizinhança sementes e alfaias.
            O grande período de prosperidade da Abadia começou durante o Reinado de D. Pedro I, que não se limitou a confirmar doações feitas pelos seus antecessores, como deu maior extensão aos domínios. Graças à tranqulidade que então reinava no pais e à sábia politica dos monges, novos colonos estabeleceram-se nos Coutos. Este período estendeu-se até ao reinado de D. Joãi I ( 1385-1433), foi sem duvida o mais ditoso de toda a história de Alcobaça sob o domínio dos cistercienses.
            A instauração da Congregação Autónoma Portuguesa, trouxe vida nova às Abadias do País. Os edifícios conventuais foram restaurados e repovoados. Alcobaça tornou-se cabeça de Ordem e o seu Abade tomou o título de Abade Geral da Congregação.
            Este foi o período dos monges artistas, entalhadores e barrsitas, a quem devemos as imagens que durante muito tempo ornamentaram a Igreja do Mosteiro. Foi também nesta época que os monges construíram a biblioteca, que se tornou famosa por toda a Europa.
            O terramoto de 1755 e a grande inundação de 1772, provocaram grandes estragos e para fazer face ás grandes despesas, que as obras de restauro e reconstrução exigiam, o Mosteiro teve que recorrer a empréstimos, que deram origem à derrocada financeira. O Abade Frei Manuel de Mendonça, ainda conseguiu restabelecer, durante um breve período a prosperidade do Mosteiro, graças a uma administração prudente e a múltiplos trabalhos de melhoramentos agrícolas e industriais. No entanto, a decadência financeira já não podia ser travada.
            Quando, em 1910, as tropas francesas entraram em Alcobaça, os soldados invadiram e saquearam a Abadia e em sequência deste desastre, a situação económica do Mosteiro piorou, não sendo possível recorrer a empréstimos indispensáveis para a reconstrução. Para além disso, o anti-clericalismo que grassava naquela época tomava por alvo os monges e a seguir à derrota de D. Miguel, em 1833, os religiosos tiveram medo e abandonaram o Mosteiro, que foi pilhado pela população dos Coutos.
            Após a extinção das Ordens Religiosas em 1834, parte do Mosteiro foi transformado em Quartel, ou destinado à Administração Pública, o restante foi vendido em hasta pública.
            Assim, as divisões administrativas, delineadas no final do Século XIX e no primeiro quartel do Século XX, desmembraram os Coutos e o vasto território que eles compreendiam, território esse que actualmente fazem parte dos concelhos de Alcobaça, Nazaré, Marinha Grande, Porto de Mós e Caldas da Rainha.

           





6.2 OS ABADES
            Os Abades de Alcobaça posuiam, para além do titulo de D. Abade do Real Mosteiro de Alcobaça, o de Esmoler-Mor do Concelho de El- Rei, de Donatário da Coroa, Senhor dos Coutos e Fronteiro-Mor.
            Como Abade tinha cadeira própria na capela da sua Igreja e usava dentro e fora do Mosteiro o hábito episcopal, eram os verdadeiros páracos de todas as Igrejas seculares das suas terras e tinham assento em cortes no banco dos Bispos.
           









BIBLIOGRAFIA

BARBOSA, Pedro. (1992). Povoamento e Estrutura Agrícola na Estremadura Central (Séc. XII a 1325). Lisboa, INIC

GARCIA, Eduíno Borges. (1986). “A Área Cultural de Alcobaça”. In:História. 95, pp. 50-66.

GARCIA, José Penha. (1937). O Problema do Azeite. Lisboa, Min. Da Agricultura.

GONÇALVES, Iria. (1989). O Património do Mosteiro de Alcobaça nos Séculos XIV e XV.Lisboa, Universidade Nova de Lisboa.

GONÇALVES, Iria. (2000). Do Pão Quotidiano nas Terras de Alcobaça ( séculos XIV e XV). In:Actas Cister, Espaços, Territórios, Paisagens. pp. 21-26

NATIVIDADE, Joaquim Vieira. (sda). “As Granjas do Mosteiro de Alcobaça”. In: NATIVIDADE, J. V.Obras Várias. Vol. II, pp. 59-79.

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NATIVIDADE, Joaquim Vieira. (sdd). A Região de Alcobaça. Obras Várias, vol. I, Alcobaça, Edição da Comissão Promotora das Cerimónias Comemorativas do I Aniversário da Morte do Prof. J. Vieira Natividade.

NATIVIDADE, Manuel Vieira. (1895). O Mosteiro de Alcobaça (Notas históricas). Coimbra, Imprensa Progresso.

NATIVIDADE, Manuel Vieira. (1906. Relatório da Exposição Alcobacense. Alcobaça D'outro Tempo. Alcobaça, Tipografia e Papelaria de António Miguel d'Oliveira.

NATIVIDADE, Manuel Vieira. (1916). “O Povo da Minha Terra. Notas e Registo de Etnografia Alcobacense”. In: Terra Portuguesa. Revista Ilustrada de Arqueologia Artística e Etnografia. 17-20, pp. 97-166.

NATIVIDADE, Manuel Vieira. (1960). Mosteiro e Coutos de Alcobaça. Alcobaça, Tipografia Alcobacense

RIBEIRO, José Diogo. (1930a). Aditamento às Memórias de Turquel. Braga, Tipografia da Pax

SILVA, Carlos; ALARCÃO, Alberto; CARDOSO, António Poppe Lopes. (1961). A Região a Oeste da Serra dos Candeeiros. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian.




























                                                                 
GLOSSÁRIO

[1] “Povoamento e estrutura agrícola na Estremadura Central (séc.XII a 1325), Pedro Gomes Barbosa.
[2] “Mosteiro e Coutos de Alcobaça”, Manuel Vieira da Natividade.
[3] “Mosteiro e Coutos de Alcobaça”, Manuel Vieira da Natividade.
[4] “Mosteiro e Coutos de Alcobaça”, Manuel Vieira da Natividade.
[5]  O Arco Próximo de Alvorninha já não existe. A estátua de D.Afonso Henriques encontra-se hoje em Leiria, no Largo, junto ao Governo Civil.
[6]  Barbosa, Pedro Gomes, 1992.
[7]  Barbosa, Pedro Gomes, 1992.
[8]  Cocheril, Dom Maur, “Alcobaça-Abadia Cisterciense de Portugal”, Imprensa Nacional-Casa da Moeda.
[9]  Barbosa, Pedro Gomes, 1992.
[10] Natividade, Joaquim Vieira da, “Obras Várias II, As Granjas do Mosteiro de Alcobaça” Comp. e Imp. Da Tipografia Alcobacense, Limitada, Alcobaça.
[11] Natividade, Joaquim Vieira da, “Obras Várias II, As Granjas do Mosteiro de Alcobaça, Comp. e Imp. Da Tipografia Alcobasense, Limitada, Alcobaça.
[12] Natividade, Joaquim Vieira da,”Obras Várias II, As Granjas do Mosteiro de Alcobaça”, Comp. e Imp. Da Tipografia Alcobacense, Limitada, Alcobaça.
[13] Barbosa, Pedro Gomes, 1992.
[14] Natividade, Joaquim Vieira da, “Obras Várias II, As Granjas do Mosreiro de Alcobaça”, Comp. e Imp. Da Tipografia Alcobacense, Limitada, Alcobaça.
[15] Natividade, Manuel Vieira da, 1960.
[16] Natividade, M. Vieira da, “O Mosteiro de Alcobaça (Notas Históricas), Imprensa Progresso, Coimbra, 1885.
[17] Natividade, Joaquim Vieira da, “Obras Várias II, As Granjas do Mosteiro de Alcobaça”, Comp. E Imp. Da Tipografia Alcobacense, Alcobaça.
[18] Natividade, J. Vieira da, “Obras Várias II, As Granjas do Mosteiro de Alcobaça”, Comp. E Imp. Da Tipografia Alcobacense, Limitada, Alcobaça.
[19] Barbosa, Pedro Gomes, 1992.
[20] Barbosa, Pedro Gomes, 1992.
[21] Natividade, M. Vieira da, 1960.
[22] Natividade, M. Vieira da, 1960.
[23] Natividade, M. Vieira da, 1960.
[24] Souza, José Pedro de Saldanha Oliveira, 1929.
[25] Souza, José Pedro de Saldanha Oliveira e, 1929
[26] Natividade, M. Vieira da, 1960.
[27] Junta de Freguesia de Alvorninha, “Alvorninha dos Antigos Coutos de Alcobaça”, Edição da Junta de Freguesia.
[28] Souza, José Pedro Saldanha Oliveira e, 1929.
[29] Natividade, M. Vieira da, 1960.
[30] Natividade, M. Vieira da; 1960.
[31] Pinto, Aralla, “Pinhal do Rei”, volume I, Tipografia José Oliveira Júnior.
[32] Souza, José Pedro de Saldanha Oliveira e, 1929.
[33] Brandão, Frei Francisco, “Quinta parte da Monarchia Lusytana”, Livro XVI, cap. LI, pág. 120,v.
[34] Delgado, Iva e Frederico, “Memórias da Vila da Cela”, ed. Câmara Municipal de Alcobaça e Junta de Freguesia da Cela.
[35] Boaventura, D. Frei Fortunato, “História Chronologica e Critica, pág. 37.
[36] Ribeiro, José Diogo, “Aditamento às Memórias de Turquel”, Braga, 1930.
[37] Natividae, M. Vieira da, 1885.
[38] Natividade, M. Vieira da, 1885.
[39] Ribeiro, José Diogo, “Aditamento às Memórias de Turquel”, Braga,1930.
[40] Souza, José Pedro de Saldanha Oliveira e, 1929.
[41] Souza, José Pedro de Saldanha Oliveira e, 1930.